Imagem retirada de: http://www.eldestiladorcultural.es/tag/martin-scorsese/
Pontuação: 9/10
M/14 | 2h41 m. | Drama, História
Título original: Silence
Realizador: Martin
Scorsese
Escrito por: Jay Cocks e
Martin Scorsese
Estrelado por: Andrew
Garfield, Adam Driver, Liam Neeson
Recordo-me de o meu
professor de Seminário VI da
licenciatura em Filosofia nos ter falado de um jesuíta de seu nome Cristóvão
Ferreira. Nessa unidade curricular dedicada ao ateísmo, conversámos, durante
algumas semanas, sobre alguns fiéis que abandonaram o Cristianismo (ora por vontade própria, ora porque se viram obrigados a tal). O nome
deste missionário ficou-me gravado na memória, talvez por, já na altura, ter
achado a sua história difícil de digerir. Ferreira (interpretado, no
filme de Scorsese, por Liam Neeson) foi um jesuíta português nascido por volta
de 1580, em Torres Vedras, que, no século XVII, foi em missão para o Japão. No
ano de 1633, Ferreira foi capturado e, após ter sido torturado durante 5 horas,
acabou por cometer apostasia. O torreense tornou-se o mais famoso dos chamados
“padres caídos” e, já com o nome de Sawano Chuan, escreveu o livro A Deceção Revelada (o título diz tudo.
Ou nada).
Silence
conta
a história de Ferreira e de outros. Conta-a de forma dura, demorada e, fazendo
jus ao título, silenciosa. Não tem banda sonora nem precisa. Neste filme, tudo
é revelado pela fotografia – belíssima fotografia de Rodrigo Prieto – à qual se
juntam gritos de dor oriundos de quem não entende por que razão não pode amar o
Deus cristão. Não bastando isto, temos as respirações. Tão próximas e tão exasperantes
que, às tantas, já não sabemos se as ouvimos das personagens ou se somos nós próprios
que estamos a expelir o ar de forma penosa.
Falo de uma
obra que demorou muito tempo a ser concluída (décadas) e que, dado o assunto
sensível que trata, exigia, a meu ver, o máximo de rigor. Enquanto retrato da tortura a que
alguns cristãos eram submetidos, Silence parece-me
quase irrepreensível – basta atentar nas cenas em que “Ferreira” está, de
pernas para o ar, com a cabeça enfiada numa fossa, com o sangue a escorrer
devido a um pequeno corte na pele (feito propositadamente pelos japoneses para
impedir uma morte rápida). Mas, infelizmente, a precisão de Scorsese esteve
ausente na escolha dos atores principais. Por melhor que tenha sido a
performance de Andrew Garfield enquanto “Padre Rodrigues”, não se compreende
que o papel não tenha sido atribuído a um ator nacional. Aquele diálogo que
acontece entre “Rodrigues” e “Ferreira” (já, há muito, “Chuan”) numa das
últimas cenas que antecedem a apostasia do primeiro (e que não deixa de ser
fantástico) deveria ter sido em português (ouvir “Deus" e não “God” pelo meio
não foi, de todo, suficiente). E não se trata, aqui, de patriotismo. Trata-se,
simplesmente, daquilo de que falei no início deste parágrafo: rigor.
De qualquer forma, o novo filme do realizador de Hugo merece ser visto, apreciado e amado. Em silêncio, por favor.
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