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domingo, 26 de fevereiro de 2017

Óscares 2017: Os Vencedores

Moonlight ganhou a estatueta mais importante da noite: a de "Melhor Filme"

La La Land, nomeado para 14 categorias, venceu em 6, inclusive a de "Melhor Realização" (Damien Chazelle, de 32 anos, é agora o realizador mais novo de sempre a receber um Óscar nesta categoria), "Melhor Atriz" (Emma Stone) e "Melhor Fotografia" (Linus Sandgren). Moonlight venceu em 3 categorias: "Melhor Ator Secundário" (Mahershala Ali), "Melhor Argumento Adaptado" e "Melhor Filme". Manchester by the Sea conseguiu fazer-se ouvir arrecadando os Óscares de "Melhor Argumento Original" e de "Melhor Ator" (Casey Affleck), bem como Hacksaw Ridge, ainda que este último em categorias técnicas ("Melhor Montagem" e "Melhor Mistura de Som").
A noite dos prémios da Academia ficou marcada por um erro no anúncio do "Melhor Filme" e a equipa de La La Land viu-se obrigada a entregar a estatueta principal à equipa que Barry Jenkins liderou.

Eis a lista completa dos vencedores:

Melhor Filme: Moonlight

Melhor Atriz: Emma Stone, por La La Land

Melhor Ator: Casey Affleck, por Manchester by the Sea

Melhor Ator Secundário: Mahershala Ali, por Moonlight

Melhor Atriz Secundária: Viola Davis, por Vedações (Fences)

Melhor Realizador: Damien Chazelle por La La Land

Melhor Argumento Original: Manchester by the Sea - Kenneth Lonergan

Melhor Argumento Adaptado: Moonlight - Barry Jenkins (adaptado de Tarell Alvin McCraney)

Melhor Filme de Animação: Zootrópolis (Zootopia)

Melhor Filme Estrangeiro: The Salesman ( Irão)

Melhor Fotografia: La La Land - Linus Sandgren

Melhor Montagem: Hacksaw Ridge - John Gilbert

Melhor Design de Produção: La La Land - David Wasco e Sandy Reynolds-Wasco

Melhor Guarda-Roupa: Monstros Fantásticos e Onde Encontrá-los - Colleen Atwood

Melhor Maquilhagem e Cabelo: Suicide Squad - Alessandro Bertolazzi, Giorgio Gregorini e Christopher Nelson

Melhor Banda Sonora Original: La La Land - Justin Hurwitz

Melhor Canção Original: La La Land - "City of Stars" - Justin Hurwitz, Benj Pasek e Justin Paul

Melhor Mistura de Som: Hacksaw Ridge - Kevin O’Connell, Andy Wright, Robert Mackenzie e Peter Grace

Melhor Edição de Som: Arrival - Sylvain Bellemare

Melhores Efeitos Visuais: O Livro da Selva - Robert Legato, Adam Valdez, Andrew R. Jones e Dan Lemmon

Melhor Documentário: OJ: Made in America - Ezra Edelman

Melhor Curta Documental: The White Helmets - Orlando von Einsiedel

Melhor Curta de Animação: Piper - Alan Barillaro


Melhor Curta: Mindenki - Kristof Deák e Anna Udvardy

"Melhor Filme" - Óscares 2017 (por ordem de preferência)

1º) La La Land: Melodia de Amor


Pontuação: 9,5/10

Vencedor de sete Globos de Ouro (incluindo o de Melhor Filme), este ano, o novo filme de Damien Chazelle não desilude. A sua história é simples: "Mia" (Emma Stone, no melhor desempenho da sua carreira, até à data) trabalha como empregada de mesa no café do estúdio Warner Bros, mas deseja singrar, como atriz, no mundo da sétima arte; "Sebastian" (Ryan Gosling) é um pianista cheio de talento que, dominado por uma enorme vontade de lutar para que o jazz não pereça, deseja abrir o seu próprio bar. A precisão de Chazelle acaba por se desvelar a cada minuto de filme até que o espectador chega àquele estado em que já não consegue pensar no que poderia estar melhor filmado, melhor cantado, melhor montado, melhor contado. Não há gestos, olhares, diálogos ou canções que não se apresentem bem no lugar onde estão. Estamos perante um musical que não é um simples mar de cantorias, mas sim um tributo, um enorme tributo, diga-se, ao cinema, ao jazz e ao amor pela arte, em geral.


2º) Manchester by the Sea


Pontuação: 8/10

Estamos perante uma obra cinematográfica que merece, sem dúvida, estar na corrida aos Óscares (o filme está nomeado em 6 categorias, incluindo as de “Melhor Filme”, “Melhor Ator Principal” e “Melhor Realização”). E merece, sobretudo, pela sua quietude, que nos permite fugir um pouco da típica, célere e, por vezes, desenfreada Hollywood. Manchester by the Sea é um filme que trata a perda, a dor, a ansiedade e até a redenção de uma forma tão cuidada que chega a ser maravilhosa. Neste filme, é Casey Affleck quem, interpretando “Lee Chandler”, mais sobressai. Estamos perante um ator que revela uma capacidade incrível e non communis de inquietar o espectador que, não raras vezes, dá por si a perguntar coisas como “afinal, sobre o que é que ele está a pensar?” ou “o que é que ele está a sentir, neste exato instante?”. Além de "Melhor Ator", que ganhe o Óscar de "Melhor Argumento Original".


3º) O Herói de Hacksaw Ridge


Pontuação: 8/10

Nomeado para 7 Óscares da Academia – "Melhor Filme", "Realizador", “Ator Principal”, “Argumento Adaptado”, “Montagem”, “Montagem de Som” e “Sonoplastia” –, O Herói de Hacksaw Ridge, apesar de não fugir ao tema predilecto de Mel Gibson (homens que enfrentam tudo e todos em nome das suas convicções) revela boas surpresas. Falamos de um trabalho que não é apenas mais um filme de guerra. É, sim, uma porta de acesso à coragem, à fé e ao excecionalismo de um homem:“Desmond T. Doss” (numa interpretação notável e, até, surpreendente, de Andrew Garfield), natural da Virgínia, Adventista do Sétimo Dia e objetor de consciência durante a II Guerra Mundial. Este filme traz a guerra, os cérebros desfeitos, os membros perdidos pelo campo de batalha de Okinawa e todo aquele sangue carregado que é claramente a marca de Gibson. O realizador recorre algumas vezes à câmara lenta, uma estratégia típica dos filmes do género “Guerra”, mas não o faz de forma exagerada nem tão-pouco para exacerbar violência gratuita.


4º) Moonlight


Pontuação: 8/10

É praticamente impossível não irmos assistir a Moonlight carregados de elevadas expectativas. Com 264 nomeações e vencedor, até à data, de 102 prémios, o filme de Barry Jenkins pode vir a ser a grande estrela da próxima cerimónia dos Óscares. Mais do que qualquer elemento – fotografia, montagem, banda sonora – é a narrativa que faz com que este filme mereça ser visto. Dividido em três partes (com os títulos “Little”, “Chiron” e “Black”, que representam a fase da infância, a da adolescência e a da adultez de “Chiron”, interpretadas por Alex R. Hibbert, Ashton Sanders e Trevante Rhodes, respetivamente), Moonlight assume-se como espelho da vida de um jovem que, desde pequeno, teve que aprender a lidar sozinho com uma mãe viciada em drogas (Naomie Harris aparece estrondosa como “Paula”), um pai ausente (especula-se que “Chiron” tenha sido fruto de um caso de uma noite só) e um bullying constante por parte dos seus colegas de escola. O que merece ser, realmente, apreciado nesta adaptação cinematográfica é a entrega e desempenho do seu elenco, bem como o realismo que subjaz a cada cena.


5º) Arrival: O Primeiro Encontro


Pontuação: 8/10


Arrival é um dos filmes mais nomeados, este ano, pela Academia – está indicado nas categorias de “Melhor Filme”, “Melhor Realizador”, “Melhor Argumento Adaptado”, “Fotografia”, “Montagem”, “Design de Produção”, “Edição de Som” e “Mistura de Som”. Apesar de se destacar, de facto, pelos seus aspetos técnicos (até pela bela banda sonora de Jóhann Jóhannsson), este filme não é apenas forma, cor ou som. É história, uma história envolvente e bem contada. A mesmidade dos dias de “Louise” (Amy Adams, deixada de fora pela Academia) termina quando esta é chamada pelo “Coronel GT Weber” (Forest Whitaker) para integrar uma missão que pode ditar o destino dos habitantes da Terra: tentar, com a ajuda do cientista “Ian” (Jeremy Renner), compreender quais as motivações dos extraterrestres com a sua vinda ao nosso planeta e o porquê de estarem espalhadas 12 naves espaciais no nosso globo. É então que começa uma viagem muito especial, uma viagem que é dos protagonistas e de nós, espectadores, que participamos de uma forma surpreendente na construção de uma ponte para o entendimento mútuo. Uma vénia aos aspetos técnicos desta película.


6º) Hell or High Water - Custe o que Custar!


Pontuação: 7,5/10

Hell or High Water está nomeado para 3 Óscares da Academia: “Melhor Filme”, “Melhor Ator Secundário“ (Jeff Bridges) e “Melhor Montagem”. Graças ao desempenho dos seus protagonistas e dos seus aspetos técnicos, a longa-metragem de David Mackenzie surpreende. Estamos perante uma história que decorre no Texas, mas que foi rodada noutro Estado americano. No entanto, as cores quentes e as paisagens texanas de cortar a respiração chegam ao espectador através da fotografia exímia de Giles Nuttgens. A banda sonora que acompanha a trama, da autoria de Nick Cave e de Warren Ellis, é congruente e a montagem de Jake Roberts é merecedora de uma vénia. Os atores Chris Pine, Ben Foster e Jeff Bridges têm performances exímias.


7º) Lion: A Longa Estrada para Casa


Pontuação: 7/10

Lion foi dos primeiros filmes nomeados para os Óscares 2017 a estrear nas salas de cinema portuguesas. É um drama que, antes de ser ficcionado, foi real. O que este filme conta é a história de vida de um menino, “Saroo” (Dev Patel) que, em 1986, se perdeu da sua pobre, mas jucunda família. Entrando num comboio que estava parado na estação onde o irmão lhe pediu que aguardasse, o pequeno adormeceu e, quando acordou, já estava longe. Perdido em Calcutá, a 1500 quilómetros da sua mãe, o rapaz de 5 anos tentou pedir ajuda a pessoas com quem se cruzava, mas o auxílio revelou-se inócuo. Se no que respeita às emoções Lion cumpriu, o mesmo se pode dizer da sua fotografia - quão belas são as imagens da viagem de comboio! - e da sua banda sonora (ambas na corrida ao Óscar), bem como de Nicole Kidman (nomeada pela Academia para a categoria de Melhor Atriz Secundária, com este filme), uma mulher que transpira amor e cuidado por todos os poros.


8º) Elementos Secretos


Pontuação: 6,5/10

West Virginia, final dos anos 50. Três mulheres, um polícia e um diálogo paupérrimo que adverte, sem demoras, o espectador: "atenção, nos próximos 120 minutos, vai ouvir falar de racismo". Mau grado os clichés que saem da boca de "Mary" (Janelle Monáe, a "Teresa" de Moonlight; non culpa pelas falas que lhe foram incumbidas), sentimos que é nosso dever dar oportunidade ao filme. Mas o argumento é tão pobre que as expectativas acabam por se dissipar por completo. O que é uma pena, pois as três histórias de vida que servem de base a Hidden Figures tinham tudo para fazer deste um grande filme. A obra apenas vislumbra a lua, numa ou noutra cena, graças às performances das suas atrizes (aliás, foram essas - mais uma que as outras - que justificaram o Prémio do Sindicato dos Atores dos EUA). O 6,5 é para elas.


9º) Vedações


Pontuação: 5/10

Vedações (Fences, no original) está nomeado para quatro Óscares da Academia: “Melhor Filme, Melhor Ator Principal” (Denzel Washington), “Melhor Atriz Secundária” (Viola Davis) e “Melhor Argumento Adaptado”. Esta longa-metragem, realizada por Denzel Washington, passa-se na década de 50 do século XX e conta a história de “Troy Maxson” (Denzel Washington), um homem que trabalha nos saneamentos de Pittsburg e que, devido à idade e à cor da sua pele, teve que abandonar o seu grande sonho: ser jogador de baseball. Estamos perante uma película, de facto, teatral, onde as interpretações são tudo. Viola Davis aparece extraordinária e faz o filme valer a pena. A um nível mais formal e técnico, Fences é uma autêntica desgraça: tem uma montagem de principiante, uma fotografia tudo menos deslumbrante e uma série de close ups desleixados.

sábado, 25 de fevereiro de 2017

"Hell or High Water" (2016). Do Texas puro e duro.


Pontuação: 7,5/10

M/16 | 1h42 min. | Drama, Ação, Crime

Título em português: Custe o que Custar!
Realizado por: David Mackenzie
Escrito por: Taylor Sheridan
Estrelado por: Chris Pine, Ben Foster, Jeff Bridges


Hell or High Water está nomeado para 3 Óscares da Academia: Melhor Filme, Melhor Ator Secundário (Jeff Bridges) e Melhor Montagem. Não é o principal candidato ao título de “Melhor Filme de 2016”, mas não desilude. Pelo contrário: graças ao desempenho dos seus protagonistas e dos seus aspetos técnicos, a longa-metragem de David Mackenzie surpreende todos aqueles que pensam que vão assistir a mais um filme de índios e cowboys.
Estamos perante uma história que decorre no Texas, mas que foi rodada noutro Estado americano. No entanto, as cores quentes e as paisagens texanas de cortar a respiração chegam ao espectador através da fotografia exímia de Giles Nuttgens. A banda sonora que acompanha a trama, da autoria de Nick Cave e de Warren Ellis, é congruente e a montagem de Jake Roberts é merecedora de uma vénia.
É graças, precisamente, aos aspetos técnicos referidos anteriormente que não adormecemos na primeira hora de filme, que se revela pobre no que a diálogos e ação diz respeito. Durante os primeiros minutos, acreditamos que estamos perante uma história banal: dois irmãos começam a assaltar bancos, um porque gosta da adrenalina que isso acarreta, o outro porque quer proporcionar aos filhos uma vida diferente daquela que sempre teve. Dos quatro assaltos que vemos “Tanner” (Ben Foster) e “Toby Howard” (Chris Pine) fazer a bancos, só o último está próximo de ser realista. Falamos de cenas que nos deveriam despertar medo e preocupação, mas isso não acontece. Não obstante, os últimos 40 minutos têm outra pujança: os diálogos são extraordinários, os olhares intensos, o sol queima, os tiros fazem-nos tremer, o choque chega, a revolta também. 
Jeff Bridges é o oficial “Marcus”, aquele que vai tentar travar os protagonistas. Aparece, como sempre, seguro e expressivo. Mas quem merecia realmente estar nomeado para Melhor Ator era Chris Pine (apenas foi nomeado, com este filme, pela San Diego e pela Las Vegas Film Critics Society Awards). O papel de ‘irmão ajuizado’ e de ‘pai a todo o custo’ assenta-lhe como uma luva, de tal forma que estamos perante a sua melhor prestação no cinema. Uma prestação que tem como pano de fundo um Texas que é um lugar quente apenas e só nos termómetros.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

"Vedações" (2016). Uma Experiência de Clausura.


Pontuação: 5/10

M/12 | 2h19 min. | Drama

Título original: Fences
Realizado por: Denzel Washington
Escrito por: August Wilson, baseado na peça de teatro Fences
Estrelado por: Denzel Washington, Viola Davis, Stephen Henderson

Vedações (Fences, no original) está nomeado para quatro Óscares da Academia: Melhor Filme, Melhor Ator Principal (Denzel Washington), Melhor Atriz Secundária (Viola Davis) e Melhor Argumento Adaptado. Irá, com certeza, ganhar um, graças à incrível Viola Davis. A única responsável por uma ligação emotiva entre o espectador e o filme.
Esta longa-metragem, realizada por Denzel Washington, passa-se na década de 50 do século XX e conta a história de “Troy Maxson” (Denzel Washington), um homem que trabalha nos saneamentos de Pittsburg e que, devido à idade e à cor da sua pele, teve que abandonar o seu grande sonho: ser jogador de baseball. Nota-se logo, desde os primeiros minutos de filme, que essa mesma renúncia é a causa de todas as mágoas e frustrações de “Troy” que, acreditanto que a dureza aufere respeito, descarrega, constantemente, o seu desgosto na mulher “Rose” (Viola Davis) e nos dois filhos (de diferentes mães).
É importante salientar que Vedações é adaptado da peça de teatro de August Wilson, estreada em 1983 e vencedora de um Prémio Pulitzer. Os protagonitas deste filme já conheciam bem as suas falas e os seus gestos, pois fizeram parte do elenco dessa produção da Broadway, a sexta de dez que compõem o chamado “Pittsburgh Cycle” (só Washington esteve mais de uma centena de vezes em palco como “Troy”).
A verdade é que estamos perante uma película, de facto, teatral, onde as interpretações são tudo. Washington está bem, mas não extraordinário: as suas palavras são tantas e saem da sua boca de forma tão desenfreada que ficamos sem tempo para observar com calma as suas expressões. Ao fim de dez minutos de filme, já nos apetece gritar “por favor, páre!”. Contudo, com Davis, acontece exatamente o contrário: a atriz vai marcando o seu lugar com uma ou outra intervenção espontânea e, quando finalmente se faz ouvir (“I’ve been standing with you! I gave eighteen years of my life to stand in the same spot as you!”), arrepia-nos e permite-nos dizer adeus, por breves instantes, à clausura que Vedações é. É de referir ainda Jovan Adepo, que aparece seguro e competente no papel de “Cory”, fazendo-nos crer que, numa casa onde imperam a resignação e o conservadorismo, ainda há quem acredite nas potencialidades do sonho.
De resto, a um nível mais formal e técnico, este filme é uma autêntica desgraça: tem uma montagem de principiante, uma fotografia tudo menos deslumbrante e uma série de close ups desleixados. E a cena final? É tão má que causa lágrimas de desgosto. Citando a personagem "Bono" (Stephen Henderson), "some people build fences to keep people out, and other people build fences to keep people in". Durante grande parte deste filme, a vontade de ficar de fora suplanta. Se há peças de teatro que devem permanecer no palco, esta é uma delas.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

"Hacksaw Ridge" (2016). Dos Homens Extraordinários.


Pontuação: 8/10

M/16 | 2h19 min. | Drama, História, Guerra

Realizador: Mel Gibson
Escrito por: Robert Schenkkan, Andrew Knight
Estrelado por: Andrew Garfield, Sam Worthington, Luke Bracey

Dez anos depois, Mel Gibson volta a pôr-se do lado de trás das câmaras e o resultado, dificilmente, poderia ser melhor. Nomeado para 7 Óscares da Academia – Melhor Filme, Realizador, Ator Principal, Argumento Adaptado, Montagem, Montagem de Som e Sonoplastia –, Hacksaw Ridge (em português, O Herói de Hacksaw Ridge), apesar de não fugir ao tema predilecto de Gibson (homens que enfrentam tudo e todos em nome das suas convicções; veja-se Braveheart, de 1995, ou A Paixão de Cristo, de 2004), revela boas surpresas.
Falamos de um trabalho que não é apenas mais um filme de guerra. É, sim, uma porta de acesso à coragem, à fé e ao excecionalismo de um homem:“Desmond T. Doss” (numa interpretação notável e, até, surpreendente, de Andrew Garfield, nomeado para o Óscar de Melhor Ator Principal), natural da Virgínia, Adventista do Sétimo Dia e objetor de consciência durante a II Guerra Mundial.
Este filme pode ser dividido em duas partes: numa primeira, conhecemos de perto a história familiar e amorosa de “Doss”. Em apenas 60 minutos, descobrimos-lhe um pai alcoólico, cheio de perdas e de feridas perenes resultantes da sua participação na I Guerra Mundial, uma mãe submissa e uma enfermeira de olhos azuis que se torna, logo à primeira vista, o seu grande amor. É também durante a primeira hora que tomamos conhecimento dos dois momentos traumatizantes que levaram o protagonista a prometer não pegar em armas nem matar seres humanos ou animais (a escolha do ângulo de filmagem durante um jantar da família “Doss” permite-nos ver que havia carne no prato de todos, menos no de “Doss”).
Já a segunda parte de Hacksaw Ridge traz a guerra, os cérebros desfeitos, os membros perdidos pelo campo de batalha de Okinawa e todo aquele sangue carregado que é claramente a marca de Gibson. O realizador recorre algumas vezes à câmara lenta, uma estratégia típica dos filmes do género “Guerra”, mas não o faz de forma exagerada nem tão-pouco para exacerbar violência gratuita. Ou então somos nós que não a conseguimos encontrar por culpa do pacifismo de “Doss”, esse jovem de sorriso fácil que aceitou ir para uma guerra sem se despojar das suas convicções éticas e religiosas.“I don’t know how I’m going to live with myself if I don’t stay true to what I believe”. Eis revelada, nesta citação, a importância que os princípios adquirem na vida de qualquer pessoa.
Alistar-se num exército exige bravura; mas fazê-lo sem a proteção que as armas auferem (ou que parecem auferir) exige muito mais. While everybody is taking life I’m going to be saving it, and that’s going to be my way to serve”. Foi, pois, assim que “Doss” serviu o seu país: salvando colegas (e até inimigos, quando preciso) imundos pelo seu sangue e pelo sangue dos outros.
Exclamando “Please Lord, help me get one more! Help me get one more!”, Desmond T. Doss, o verdadeiro, falecido em 2006, conseguiu salvar 75 homens, ganhar a sua própria guerra, obter uma condecoração e sentir nos olhos dos outros um respeito e admiração infindáveis.
Termino expressando um profundo e sincero agradecimento a Gibson que, através do cinema, nos fez recordar um homem extraordinário.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

"Arrival" (2016). Para uma Filosofia da Linguagem.



Pontuação: 8/10

M/12 | 1h56 min. | Drama, Mistério, Sci-Fi

Realizado por: Denis Villeneuve
Escrito por: Eric Heisserer; baseado no conto "Story of Your Life", de Ted Chiang
Estrelado por: Amy Adams, Jeremy Renner, Forest Whitaker

Arrival é um dos filmes mais nomeados, este ano, pela Academia – está indicado nas categorias de “Melhor Filme”, “Melhor Realizador”, “Melhor Argumento Adaptado”, “Fotografia”, “Montagem”, “Design de Produção”, “Edição de Som” e “Mistura de Som”. Apesar de se destacar, de facto, pelos seus aspetos técnicos (até pela bela banda sonora de Jóhann Jóhannsson que, curiosamente, ficou de fora na corrida ao respetivo Óscar), este filme não é apenas forma, cor ou som. É história, uma história envolvente e bem contada.
Quando lemos artigos que nos falam de filmes sobre extraterrestres pensamos logo: “Ó, não, mais um!”. A verdade é que podemos sossegar os nossos corações, porque esta longa-metragem de Denis Villeneuve (realizador de Raptadas, O Homem Duplicado, Sicário – Infiltrado) é muito mais do que um retrato de alienígenas que chegam à Terra com o intuito de fazer os seres humanos tiritar. Mais do que girar em torno de seres estranhos, Arrival é uma espécie de tributo à linguagem e à nossa capacidade de comunicação. São muitas as passagens que nos ficam na memória aquando da ficha técnica, mas há uma que não podia deixar de referir: “Language is the foundation of civilization. It is the glue that holds a people together. It is the first weapon drawn in a conflict” ("Louise").
“Louise Banks” (Amy Adams, brilhante, mas não tanto como em Nocturnal Animals - onde aparece crua e emotiva, ao mesmo tempo), professora numa universidade americana e uma das mais conceituadas linguistas do mundo, acredita peremptoriamente que a linguagem é o berço de todas as civilizações e que é ela mesma que permite que os seres humanos se desenvolvam, se compreendam e se respeitem. Não obstante, apesar de ler e de escrever sobre comunicação, “Louise” aparenta ser uma pessoa extremamente solitária, que vive para as suas aulas e para o vinho tinto servido num único copo com vista para o oceano. Explica a personagem, a dada altura, que “you can understand communication and still end up single”.
A mesmidade dos dias de “Louise” termina quando esta é chamada pelo “Coronel GT Weber” (Forest Whitaker) para integrar uma missão que pode ditar o destino dos habitantes da Terra: tentar, com a ajuda do cientista “Ian” (Jeremy Renner), compreender quais as motivações dos extraterrestres com a sua vinda ao nosso planeta e o porquê de estarem espalhadas 12 naves espaciais no nosso globo, em sítios que, aparentemente, não têm qualquer ponto em comum. É então que começa uma viagem muito especial, uma viagem que é dos protagonistas e de nós, espectadores, que participamos de uma forma surpreendente na construção de uma ponte para o entendimento mútuo. Com a ajuda de “Louise”, da montagem e de todos os outros aspetos técnicos deste filme, somos impelidos a descodificar, a ler nas entrelinhas, a pensar.
É esse o grande mérito de Villeneuve: pôr os nossos pensamentos a correr a uma velocidade difícil de acompanhar. Neste encontro, magnífico encontro, ainda nos é oferecida a oportunidade de viajar no tempo e de respirar fundo perante imagens fantásticas de uma paisagem verdejante. E, como se não bastasse tudo isto, o escritor de Arrival não esquece a hipótese que Edward Sapir e Benjamin Lee Whorf lançaram na década de 30: uma hipótese que postula que os seres humanos têm universos mentais distintos, universos esses que são profundamente influenciados pelas diferentes línguas que falam. Esta teoria é referida no filme e muito bem. Dá vontade de regressar à Filosofia da Linguagem e a tudo o que ela tem para oferecer no que respeita à árdua e penosa tarefa que é compreender o homem.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

"Jackie" (2016). Dois tipos de mulher.



Pontuação: 7,5/10

M/12 | 1h40 min. | Drama, Biografia

Realizado por: Pablo Larraín
Escrito por: Noah Oppenheim
Estrelado por: Natalie Portman, Peter Sarsgaard, Caspar Phillipson


O mundo das artes audiovisuais já nos tinha oferecido duas obras notáveis sobre o antigo presidente dos EUA John F. Kennedy: falamos de JFK (1991), realizado por Oliver Stone e estrelado por Kevin Costner (no papel de “Jim Garrison”, um procurador público que investigou arduamente o assassinato do 35º presidente americano); e da recente mini-série 11.22.1963 (2016), baseada no romance com o mesmo nome de Stephen King, com o total de 8 episódios que retratam a vida de um professor de inglês, “Jake Epping” (James Franco), que, através de uma viagem no tempo, vai tentar prevenir a morte de Kennedy.

Uma das cenas de JFK, com Kevin Costner no principal papel

James Franco no papel de "Jake", em 11.22.1963


Mas nunca o cinema nos tinha concedido um olhar sobre Jacqueline Kennedy, uma mulher que, aos 34 anos, teve que aprender a lidar com o facto de se tornar mulher do presidente de uma das maiores potências mundiais. Quis o destino que o seu cargo de primeira dama durasse pouco tempo (entre 1961 e 1963). Não obstante o pouco tempo que esteve na Casa Branca, a sua marca parece ter-se tornado perene.
Jackie não é um filme extraordinário, mas a sua protagonista é. A nova longa-metragem de Pablo Larraín é Natalie Portman (nomeada para o Óscar de Melhor Atriz, um Óscar que parece inviável dada a concorrência deste ano – falamos, claro, das perfeitas Emma Stone e de Isabelle Huppert). A atriz israelita encarna o papel de “Jackie” (era assim que Jacqueline era conhecida) de forma sublime: a sua postura, a sua voz, a maneira como pega em cada cigarro que fuma, tudo relembra a verdadeira ex primeira dama. Já a interpretação que Portman faz da visita guiada à Casa Branca, transmitida numa TV americana em fevereiro de 1962 (podem procurar as imagens da original no Youtube), é um tanto ou quanto caricaturesca (quase parece que estamos a ver um daqueles anúncios publicitários de aspiradores), mas, se pensarmos bem, não poderia ser de outra forma. Afinal, estamos a recordar um episódio que muitos americanos tomaram, na altura, como constrangedor e fútil.
Apesar de ser do conhecimento geral que “Jackie” gostava de decoração, de concertos exuberantes e de outros tantos excessos, houve uma parte de si que permaneceu sempre mais escondida, uma parte a que este filme tenta fazer jus, nomeadamente quando ouvimos a personagem principal confessar "I never wanted fame. I just became a Kennedy”.
A homenagem à ex primeira dama é prestada com todos os minutos que o realizador dedicou à preparação do funeral de Kennedy: a partir do momento em que vê o seu vestido cor de rosa manchado com o sangue do seu marido (se este filme ganhar o Óscar de Melhor Guarda Roupa, devemos aplaudir, pois é, de facto, merecido), aquando daquela visita a Dallas no dia 22 de novembro de 1963, “Jackie” vê-se obrigada a camuflar a dor e a fazer de tudo para igualar o funeral de Kennedy ao de Abraham Lincoln, o ex presidente responsável pela abolição da escravatura nos EUA. 
There are two kinds of women, those who want power in the world and those who want power in bed”. Com o marido assassinado, “Jackie” não poderia deixar a sua marca na cama. Apenas no mundo. O que era escusado era vermos esse esforço com uma música de fundo de tal forma tensa que chega a ser desgastante. A banda sonora da compositora Mica Levi surge, neste filme, como um exagero que, por vezes, nos distrai do essencial.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Manchester by the Sea (2016). Das Maravilhas do Sofrimento.



Pontuação: 8/10

M/14 | 2h17 min. | Drama

Realizado por: Kenneth Lonergan
Escrito por: Kenneth Lonergan
Estrelado por: Casey Affleck, Michelle Williams, Lucas Hedges


Associar ‘maravilhas’ ao verbo 'sofrer' soa estranho e provoca logo um sentimento um tanto ou quanto inusitado. Não obstante, não arranjei título melhor para a minha crítica a Manchester by the Sea: um filme que trata a perda, a dor, a ansiedade e até a redenção de uma forma tão cuidada que chega a ser... isso mesmo, maravilhosa.
Há uns anos, Matt Damon pediu a Kenneth Lonergan que escrevesse o argumento desta obra para, depois, se lançar no mundo da realização. O trabalho final que Lonergan apresentou impressionou de tal forma o ator que este acabou por lhe atribuir a realização do mesmo. Foi assim que nasceu Manchester by the Sea, a terceira longa-metragem de um homem que não se cansa de compelir os espectadores de cinema a lidar com a dimensão trágida da vida humana. Podes Contar Comigo (2000) – um drama familiar que gira em torno do reencontro entre dois irmãos que estiveram, durante anos, separados – e Margaret (2011) – sobre uma rapariga que, com um aceno, distraiu um motorista que acabou por atropelar uma mulher grávida – também nos colocaram frente a frente, tal como esta sua última obra coloca, com a morte e com problemas familiares difíceis de ultrapassar.
Não descurando o excelente trabalho de realização de Lonergan nem a parte técnica deste filme (sobretudo a sua fotografia, que oferece a neve e o mar de uma forma tão espantosa que quase conseguimos sentir o frio do inverno e a agitação marítima por debaixo dos nossos pés), é Casey Affleck quem, interpretando “Lee Chandler”, mais sobressai. Estamos perante um ator que revela uma capacidade incrível e non communis de inquietar o espectador que, não raras vezes, dá por si a perguntar coisas como “afinal, sobre o que é que ele está a pensar?” ou “o que é que ele está a sentir, neste exato instante?”. A sua prestação é de tal forma brilhante que nunca sabemos bem o que é que “Chandler” vai dizer ou fazer. Os seus momentos em silêncio, esses, angustiam-nos, sufocam-nos, emocionam-nos. E, com um argumento tão realista, tão duro, tão amargurado, era precisamente isso que se pretendia.
“Chandler” é aquele tipo revoltado que consegue facilmente começar à porrada num pub. Natural de Manchester e do seu mar, viu-se obrigado a mudar para Boston, onde tem uma vida profundamente taciturna, uma vida que pode, muito bem, ser encarada de duas formas: como fuga à obrigatoriedade de redenção que certas atitudes passadas impõem; ou enquanto redenção, per se. Acontece que o seu regresso ao lugar que dá nome a esta obra de Lonergan é exigido aquando da morte do seu irmão mais velho que, sem aviso prévio, o nomeou tutor de “Patrick” (é de ressalvar a excelente exibição de Lucas Hedges que se revelou, aqui, um ator bastante promissor), um adolescente que tem os seus amigos, as suas duas namoradas, a sua banda e toda uma vida que não está disposto a deixar, em Manchester.
É verdade que este drama gira em torno de “Lee Chandler”. Não obstante, não é menos verdade que, por ter partilhado os males do protagonista, a personagem “Randi Chandler” (interpretada por Michelle Williams) merecia um pouco mais de tempo no ecrã (a única conversa esclarecedora que decorre entre o ex-casal não satisfaz e, quando digo isto, não falo das performances dos atores, pois tanto Affleck como Williams são exímios).
De resto, estamos perante uma obra cinematográfica que merece, sem dúvida, estar na corrida aos Óscares (o filme está nomeado em 6 categorias, incluindo as de “Melhor Filme”, “Melhor Ator Principal” e “Melhor Realização”). E merece, sobretudo, pela sua quietude, que nos permite fugir um pouco da típica, célere e, por vezes, desenfreada Hollywood.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

"Hidden Figures" (2016). Da Lua apenas Vislumbres.

Imagem retirada de: http://www.elle.com/culture/movies-tv/news/a40826/hidden-figures-trailer/


Pontuação: 6.5/10

M/12 | 2h07 | Biografia, Drama, História

Título original: Hidden Figures
Realizado por: Theodore Melfi
Escrito por: Allison Schroeder, Theodore Melfi; baseado na obra de Margot Lee Shetterly
Estrelado por: Taraji P. Henson, Octavia Spencer, Janelle Monáe, Kevin Costner


West Virginia, final dos anos 50. Três mulheres, um polícia e um diálogo paupérrimo que adverte, sem demoras, o espectador: "atenção, nos próximos 120 minutos, vai ouvir falar de racismo". Mau grado os clichés que saem da boca de "Mary" (Janelle Monáe, a "Teresa" de Moonlight; non culpa pelas falas que lhe foram incumbidas), sentimos que é nosso dever dar oportunidade ao filme, que ainda agora começou. Mas o argumento é tão pobre que as expectativas acabam por se dissipar por completo. O que é uma pena, pois as três histórias de vida que servem de base a Hidden Figures tinham tudo para fazer deste um grande filme (contando que é sempre um enorme desafio realizar uma boa obra cinematográfica do género biográfico).
O título desta longa-metragem de Theodore Melfi teve origem nos "elementos secretos" que estiveram por detrás do lançamento de John Glenn para a órbita, um sonho que a nação americana augurava concretizar por forma a igualar e até superar a Rússia na corrida espacial: falamos de três mulheres que se destacaram, dentro da NASA (onde a segregação racial evidenciava-se nas casas de banho, nas chaleiras com café quente e, claro, nos próprios departamentos), devido à sua inteligência, perspicácia e coragem - "Katherine G. Johnson" (interpretada por Taraji P. Henson, nomeada uma única vez pela Academia, em 2009, para Melhor Atriz Secundária, com The Curious Case of Benjamin Button - O Estranho Caso de Benjamin Button, em português), "Dorothy Vaughan" (Octavia Spencer, vencedora de um Globo de Ouro e de um Óscar, em 2012, por The Help - As Serviçais) e a já referida "Mary Jackson". São precisamente as três atrizes que dão vida a estas personagens que fazem o filme valer a pena (o 6.5/10 é todo para elas). Apesar de Octavia Spencer ser a única das três a estar nomeada para um Óscar, este ano (o de "Melhor Atriz Secundária), é Taraji P. Henson quem mais sobressai (ela, sim, merecia a nomeação), nomeadamente quando, ao ser chamada à atenção pelo seu patrão "Al Harrison" (Kevin Costner) pelo tempo que passava fora do escritório, esta lhe grita, profundamente emocionada e indignada: "There are no colored bathrooms in this building, or any building outside the West Campus, which is half a mile away. Did you know that?".
A cena anterior faz com que sintamos, por segundos, aquilo que o filme de Melfi poderia ser, mas não é. A resposta que "Katherine" dá a "Al Harrison" quando este a questiona sobre a possibilidade de os americanos chegarem, um dia, à lua - "we're already there, sir"-, não pode ser a mesma que damos quando nos perguntamos sobre até onde é que este filme consegue ir. Hidden Figures apenas a vislumbra, numa ou noutra cena, e em tudo, repito, graças às performances das suas atrizes (aliás, foram essas - mais uma que as outras - que justificaram o Prémio do Sindicato dos Atores dos EUA).
As três inteligências da NASA mereciam, sem sombra de dúvida, melhor homenagem. 

domingo, 5 de fevereiro de 2017

"Moonlight" (2016). Do Azul do Luar.



Pontuação: 8/10

M/16 | 1h51 m. | Drama

Realizado por: Barry Jenkins
Escrito por: Berry Jenkins; adaptado da peça de Tarell Alvin McCraney
Estrelado por: Mahershala Ali, Shariff Earp, Duan Sanderson, Naomie Harris


É praticamente impossível não irmos assistir a Moonlight carregados de elevadas expectativas. Com 264 nomeações e vencedor, até à data, de 102 prémios, o filme de Barry Jenkins pode vir a ser a grande estrela da próxima cerimónia dos Óscares. Se merece? Talvez. Se merece mais que os outros? Nem por isso.
O argumento deste filme está intrinsecamente ligado à história de vida dos seus criadores: primeiro, porque se baseia na peça de teatro In Moonlight Black Boys Look Blue, de Tarell Alvin McCraney, afro-americano e gay; segundo, porque o seu realizador Barry Jenkins (esta é apenas a sua segunda longa metragem), também afro-americano mas não gay, teve uma infância muito idêntica à da personagem central “Chiron”. Em entrevista à revista E, do Expresso, Jenkins confessou que também era pobre, tinha uma mãe perturbada e o primeiro amigo branco que teve foi aos 18 anos, quando já andava na universidade.
Mais do que qualquer elemento – fotografia, montagem, banda sonora (que não é nada má) – é a narrativa que faz com que este filme mereça ser visto. Dividido em três partes (com os títulos “Little”, “Chiron” e “Black”, que representam a fase da infância, a da adolescência e a da adultez de “Chiron”, interpretadas por Alex R. Hibbert,  Ashton Sanders e Trevante Rhodes, respetivamente), Moonlight assume-se como espelho da vida de um jovem que, desde pequeno, teve que aprender a lidar sozinho com uma mãe viciada em drogas (Naomie Harris aparece estrondosa como “Paula”), um pai ausente (especula-se que “Chiron” tenha sido fruto de um caso de uma noite só) e um bullying constante por parte dos seus colegas de escola. A compreensão e o companheirismo chegam apenas de três personagens que, não sendo família, revelam-se cruciais no seu processo de maturação: “Juan” (Mahershala Ali) e a sua esposa “Teresa” (Janelle Monáe) acabam por ser os pais que faltavam, e “Kevin” (Jaden Piner, Jharrel Jerome e André Holland) o único amigo e amor da vida de “Chiron”, aquele que o desperta para a sexualidade.
Moonlight tem sido muito aclamado por espelhar na tela a história de um negro gay, mas não é a primeira vez que isso acontece no cinema – basta recordarmos, por exemplo, Pariah, de 2011, realizado por Dee Res, sobre “Alike”, uma adolescente de cor que, à medida que vai crescendo, não sabe se deve expressar a sua verdadeira tendência sexual. Esta história não é, portanto, inédita, ao contrário do que se tem lido por aí. Além disso, também não é a primeira vez que um cineasta decide mostrar a evolução de alguém, nos seus diversos estágios (recordemos o oscarizado Boyhood que trouxe para o grande ecrã, em 2014, a evolução de uma família ao longo dos anos).
Posto isto, não podemos alegar que é a originalidade que faz de Moonlight o principal candidato ao Óscar de Melhor Filme, este ano. O que merece ser, realmente, apreciado nesta adaptação cinematográfica é a entrega e desempenho do seu elenco, bem como o realismo que subjaz a cada cena. Trata-se, de facto, de uma história bem contada, de tal forma que conseguimos sentir algumas vezes que, ao luar, os rapazes negros parecem mesmo azuis.
Moonlight, com o seu quê de positivo e de negativo, marca, sem dúvida, 2017. Aliás, Jenkins não podia ter trazido o filme em melhor altura. Afinal, como tem sido falado, parece haver uma vontade desmesurada, por parte da Academia, de pedir perdão pelos "Oscars so White" do ano passado. O que me entristece quando falo deste filme é a imagem que me surge, de forma imediata e sem a devida autorização, na mente: vejo Hollywood a mirar Moonlight e a exclamar "um filme só de negros? Veio mesmo a calhar!".
Termino com a esperança de que haja bom senso e rigor na entrega dos Óscares 2017. É disso que o mundo precisa. No cinema e fora dele.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

"Lion" (2016) - Do eterno retorno a casa.



Pontuação: 7/10


M/12 | 1H58m. | Drama

Título original: Lion
Realizado por: Garth Davis
Escrito por: Saroo Brierley. Adaptado da obra A Long Way Home, de Luke Davies
Estrelado por: Dev Patel, Nicole Kidman, Rooney Mara

Lion foi dos primeiros filmes nomeados para os Óscares 2017 a estrear nas salas de cinema portuguesas. É um drama que, antes de ser ficcionado, foi real. O que este filme conta é a história de vida de um menino que, em 1986, se perdeu da sua pobre, mas jucunda família. Entrando num comboio que estava parado na estação onde o irmão lhe pediu que aguardasse, o pequeno “Saroo” (interpretado, numa primeira parte, por Sunny Pawar) adormeceu e, quando acordou, já estava longe. Perdido em Calcutá, a 1500 quilómetros da sua mãe, o rapaz de 5 anos tentou pedir ajuda a pessoas com quem se cruzava, mas o auxílio revelou-se inócuo. “Saroo” não conseguia pronunciar corretamente o nome da sua terra.
Garth Davis construiu inteligentemente as cenas que antecedem a adoção de “Saroo”. Arriscaria mesmo dizer que conseguiu produzir o efeito pretendido no espectador: o brotar de uma enorme empatia pela personagem que, avidamente, tenta sobreviver num ambiente urbano desconhecido. É quase impossível não nos sentirmos enternecidos com o frágil e, ao mesmo tempo, desenrascado “Saroo” (é que, para além das suas expressões faciais e das suas atitudes, nós temos a consciência de que estamos a assistir a uma luta que ocorreu, de facto).
Se no que respeita às emoções Lion cumpriu, o mesmo se pode dizer da sua fotografia - quão belas são as imagens da viagem de comboio! - e da sua banda sonora (ambas na corrida ao Óscar), bem como de Nicole Kidman (também nomeada pela Academia para a categoria de Melhor Atriz Secundária, com este filme), que desempenha o papel de “Sue Brierley”, a mãe adotiva de “Saroo”, uma mulher que transpira amor e cuidado por todos os poros. Aliás, neste filme, o amor de mãe chegava. O romance sem qualquer fulgor entre o já adulto “Saroo” (Dev Patel) e “Lucy” (Rooney Mara) acrescenta um único elemento a esta história: agastamento. E esse dispensava-se.
Não me parece que Lion vá ganhar qualquer Óscar no próximo dia 26, mas conseguiu 6 nomeações (incluíndo, para além das supra mencionadas, a de Melhor Filme) e presenteou-nos com uma mensagem que não deve ser desprezada: a verdade é que, por melhor que estejamos, no final, há sempre qualquer coisa que nos faz regressar a casa.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Sobre "La La Land" (2016). Um filme para os tolos que sonham.



Pontuação: 9.5/10

M/12 | 2h08m. | Comédia, Drama, Musical

Título original: La La Land
Realizado por: Damien Chazelle
Escrito por: Damien Chazelle
Estrelado por: Emma Stone, Ryan Gosling, John Legend


La La Land: Melodia de Amor é um nome que tem reinado no vocabulário dos amantes de cinema, nos últimos tempos. Vencedor de sete Globos de Ouro (incluindo o de Melhor Filme), este ano, o novo filme de Damien Chazelle não desilude. A sua história é simples: "Mia" (Emma Stone, no melhor desempenho da sua carreira, até à data) trabalha como empregada de mesa no café do estúdio Warner Bros, mas deseja singrar, como atriz, no mundo da sétima arte; "Sebastian" (Ryan Gosling, que, de forma pouco justa, acaba por passar algo despercebido dada a exuberância da colega com quem contracena) é um pianista cheio de talento que, dominado por uma enorme vontade de lutar para que o jazz não pereça, deseja abrir o seu próprio bar. Entre audições e pequenos concertos, as duas personagens acabam por se conhecer e é no decorrer de uma dança que vai sendo iluminada pelo amanhecer de Los Angeles que a paixão se deixa revelar.

É verdade que no início do filme chegamos a pensar que Chazelle nos coloca frente a frente com mais um lugar-comum: uma mulher e um homem que lutam para ficar juntos, no final. A juntar à iminência do cliché, temos uma cena inicial que poderia ser brilhante não fosse a pouca precisão dos figurantes que cantam "Another Day of Sun" no seio de um engarrafamento gigantesco. Mas, justiça seja feita, a precisão acaba por se desvelar a cada minuto de filme até que o espectador chega àquele estado em que já não consegue pensar no que poderia estar melhor filmado, melhor cantado, melhor montado, melhor contado. Não há gestos, olhares, diálogos (como é perfeito o do jantar-surpresa que "Sebastian" proporciona a "Mia", na sua casa!) ou canções que não se apresentem bem no lugar onde estão. Aquele receio inicial de um final predito vai-se evaporando à medida que a história se desenrola e dá lugar a uma mensagem que nunca – muito menos com a resignação que paira nos nossos dias – deve ser tida como obsoleta ou gasta: “abracem os vossos sonhos mesmo que esses sonhos vos angustiem e atropelem a realidade”.

Estamos perante um musical que não é um simples mar de cantorias, mas sim um tributo, um enorme tributo, diga-se, ao cinema (à janela de Casablanca e a todas as outras janelas filmadas, não só em Los Angeles como em todos os outros lugares do mundo), ao jazz e ao amor pela arte, em geral (já tínhamos sentido esse amor com Whiplash - Nos Limites, em 2014). Como canta "Mia" (Emma Stone arrepia qualquer espectador atento, nesta cena) na sua última "Audition" antes da sua ida para Paris, "here's to the ones / who dream / foolish, as they may seem...".

Esta obra é, pois, para todos aqueles tolos que ainda se permitem sonhar.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Óscares 2017 - Os Nomeados

Foram divulgados hoje, um mês antes da cerimónia, a lista de nomeados aos Óscares 2017. Na corrida à estatueta de Melhor Filme estão: Arrival, O Herói de Hacksaw Ridge, Lion, Hidden Figures, Moonlight, Fences, Hell or High Water, La La Land e Manchester by the Sea. Vencedor de 7 Globos de Ouro, La La Land é o favorito. Aliás, o musical de Damien Chazelle (que é uma homenagem à cidade de Los Angeles, onde irá decorrer a cerimónia dos Óscares) tem nada mais, nada menos, que 14 nomeações em 13 categorias (concorre com duas canções ao prémio de Melhor Canção Original), incluindo, para além das já citadas, Melhor Realizador, Melhor Argumento Original, Melhor Ator Principal (Ryan Gosling) e Melhor Atriz Principal (Emma Stone). La La Land é, assim, a par de Eva (1950) e de Titanic (1997), o filme mais nomeado de sempre. Já Moonlight está nomeado para 8 categorias, bem como Arrival, protagonizado por Amy Adams - que, curiosamente, ficou fora da corrida ao Óscar de Melhor Atriz Principal (a concorrência era bastante forte: Natalie Portman, com Jackie, Ruth Negga, com Loving, Emma Stone, com La La Land, a vencedora do Globo de Ouro Isabelle Huppert, com Elle, e, claro, aquela que não podia faltar nesta lista e que já atingiu as 20 nomeações à estatueta dourada - falamos, claro, de Meryl Streep, desta vez com Florence). É de ressalvar ainda que o filme Silence, de Martin Scorsese (ver publicação infra), está nomeado apenas para uma categoria (Melhor Fotografia). 
Pode ver a lista completa dos nomeados através do seguinte link: http://www.tvi24.iol.pt/cinema/filmes/veja-a-lista-completa-dos-nomeados-para-os-oscars-2017
Durante o mês de fevereiro, serão publicadas criticas aos filmes que estão na corrida. A cerimónia dos Óscares irá realizar-se, como sempre, no final desse mês, no dia 26, e terá a apresentação de Jimmy Kimmel. Para já, fica aqui uma das canções que está a lutar pelo prémio - "City of Stars", de La La Land: