terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Manchester by the Sea (2016). Das Maravilhas do Sofrimento.



Pontuação: 8/10

M/14 | 2h17 min. | Drama

Realizado por: Kenneth Lonergan
Escrito por: Kenneth Lonergan
Estrelado por: Casey Affleck, Michelle Williams, Lucas Hedges


Associar ‘maravilhas’ ao verbo 'sofrer' soa estranho e provoca logo um sentimento um tanto ou quanto inusitado. Não obstante, não arranjei título melhor para a minha crítica a Manchester by the Sea: um filme que trata a perda, a dor, a ansiedade e até a redenção de uma forma tão cuidada que chega a ser... isso mesmo, maravilhosa.
Há uns anos, Matt Damon pediu a Kenneth Lonergan que escrevesse o argumento desta obra para, depois, se lançar no mundo da realização. O trabalho final que Lonergan apresentou impressionou de tal forma o ator que este acabou por lhe atribuir a realização do mesmo. Foi assim que nasceu Manchester by the Sea, a terceira longa-metragem de um homem que não se cansa de compelir os espectadores de cinema a lidar com a dimensão trágida da vida humana. Podes Contar Comigo (2000) – um drama familiar que gira em torno do reencontro entre dois irmãos que estiveram, durante anos, separados – e Margaret (2011) – sobre uma rapariga que, com um aceno, distraiu um motorista que acabou por atropelar uma mulher grávida – também nos colocaram frente a frente, tal como esta sua última obra coloca, com a morte e com problemas familiares difíceis de ultrapassar.
Não descurando o excelente trabalho de realização de Lonergan nem a parte técnica deste filme (sobretudo a sua fotografia, que oferece a neve e o mar de uma forma tão espantosa que quase conseguimos sentir o frio do inverno e a agitação marítima por debaixo dos nossos pés), é Casey Affleck quem, interpretando “Lee Chandler”, mais sobressai. Estamos perante um ator que revela uma capacidade incrível e non communis de inquietar o espectador que, não raras vezes, dá por si a perguntar coisas como “afinal, sobre o que é que ele está a pensar?” ou “o que é que ele está a sentir, neste exato instante?”. A sua prestação é de tal forma brilhante que nunca sabemos bem o que é que “Chandler” vai dizer ou fazer. Os seus momentos em silêncio, esses, angustiam-nos, sufocam-nos, emocionam-nos. E, com um argumento tão realista, tão duro, tão amargurado, era precisamente isso que se pretendia.
“Chandler” é aquele tipo revoltado que consegue facilmente começar à porrada num pub. Natural de Manchester e do seu mar, viu-se obrigado a mudar para Boston, onde tem uma vida profundamente taciturna, uma vida que pode, muito bem, ser encarada de duas formas: como fuga à obrigatoriedade de redenção que certas atitudes passadas impõem; ou enquanto redenção, per se. Acontece que o seu regresso ao lugar que dá nome a esta obra de Lonergan é exigido aquando da morte do seu irmão mais velho que, sem aviso prévio, o nomeou tutor de “Patrick” (é de ressalvar a excelente exibição de Lucas Hedges que se revelou, aqui, um ator bastante promissor), um adolescente que tem os seus amigos, as suas duas namoradas, a sua banda e toda uma vida que não está disposto a deixar, em Manchester.
É verdade que este drama gira em torno de “Lee Chandler”. Não obstante, não é menos verdade que, por ter partilhado os males do protagonista, a personagem “Randi Chandler” (interpretada por Michelle Williams) merecia um pouco mais de tempo no ecrã (a única conversa esclarecedora que decorre entre o ex-casal não satisfaz e, quando digo isto, não falo das performances dos atores, pois tanto Affleck como Williams são exímios).
De resto, estamos perante uma obra cinematográfica que merece, sem dúvida, estar na corrida aos Óscares (o filme está nomeado em 6 categorias, incluindo as de “Melhor Filme”, “Melhor Ator Principal” e “Melhor Realização”). E merece, sobretudo, pela sua quietude, que nos permite fugir um pouco da típica, célere e, por vezes, desenfreada Hollywood.

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