sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

"Confesso" (1953). Do Secretismo da Confissão.



M/12 | 1h35 min. | Crime, Drama, Film-Noir

Título original: I Confess
Realizado por: Alfred Hitchcock
Escrito por: George Tabori e William Archibald, adaptado da peça de Paul Anthelme
Estrelado por: Montgomery Clift, Anne Baxter, O. E. Hasse


"I never thought of the priesthood as offering a hiding place" ("Logan")

I Confess, de 1953, realizado pelo mestre do suspense Alfred Hitchcock, à época proibido na Irlanda e mal recebido pela generalidade dos espectadores ingleses, é adaptado de uma peça francesa de Paul Anthelme, de 1902. Falamos de um filme bastante direto, com planos envolventes (como aquele que vemos supra) e despido de frivolidades. Já o mote do argumento, esse fica bem patente logo nos minutos iniciais da película: o psicologismo da confissão.
"I want to make a confession". É esta a frase, proferida por "Keller" (O. E. Hasse), um "faz-tudo" de uma paróquia do Quebeque, Canadá, que interrompe a calmaria noctívaga do "Padre Logan" (Montgomery Clift). Se, a princípio, acreditamos que "Keller" sente arrependimento pelo homicídio que acabou de cometer (a sua expressão fisionómica espelha medo e até algum desespero), depressa constatamos que a confissão que faz não passa, para si próprio, de um mero ato protocolar. Já para "Logan", a declaração acarreta um efeito possante - um dilema moral.
Levanta-se a questão: deverá "Logan" ser fiel ao segredo da confissão ou ao ideal de justiça humana? O mais interessante de I Confess é que a resposta à pergunta anterior não surge de forma simples e imediata, aliás, o problema em causa intensifica-se e torna-se de cariz pessoal: "Logan" acaba por se tornar o principal suspeito do assassinato em causa e tudo graças a um amor antigo de seu nome "Ruth" (Anne Baxte) - uma mulher, então casada, com quem continua a manter contacto (o defunto conhecia a relação de ambos e andava a chantageá-los, pelo que o Padre saiu a ganhar com a sua morte).
Pelo seu argumento e também pela sua montagem, torna-se quase impossível não nos envolvermos de uma forma extraordinária com este filme: a cada cena, a cada pergunta levantada pela polícia, a cada expressão, a cada afastar de lábios, ansiamos pela verdade e pela consequente absolvição de "Logan". Mas o Padre não o faz nem tão pouco deixa totalmente claro qual o motivo que pesa mais no seu consciente: se o sigilo divino, se o facto de ele próprio se sentir culpado.
Estamos perante um filme que espelha, de facto, uma situação de "transferência de culpa": "Logan" representa um "falso culpado" no que ao homicídio diz respeito; por outro lado, é um "culpado declarado" por ainda sentir algum desejo por "Ruth" (agora, o pecado já não é do pecador, mas de quem o absolve sem se conseguir absolver a si). E não precisa de o revelar por palavras. O seu rosto fechado fala por si.
Rostos fechados, silêncios ensurdecedores, crucifixos que relembram o voto de castidade e uma série de olhares curiosos - eis os aspetos que tornam esta obra de Hitchcock inesquecível. Uma das melhores do realizador britânico, confesso.


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