domingo, 5 de fevereiro de 2017

"Moonlight" (2016). Do Azul do Luar.



Pontuação: 8/10

M/16 | 1h51 m. | Drama

Realizado por: Barry Jenkins
Escrito por: Berry Jenkins; adaptado da peça de Tarell Alvin McCraney
Estrelado por: Mahershala Ali, Shariff Earp, Duan Sanderson, Naomie Harris


É praticamente impossível não irmos assistir a Moonlight carregados de elevadas expectativas. Com 264 nomeações e vencedor, até à data, de 102 prémios, o filme de Barry Jenkins pode vir a ser a grande estrela da próxima cerimónia dos Óscares. Se merece? Talvez. Se merece mais que os outros? Nem por isso.
O argumento deste filme está intrinsecamente ligado à história de vida dos seus criadores: primeiro, porque se baseia na peça de teatro In Moonlight Black Boys Look Blue, de Tarell Alvin McCraney, afro-americano e gay; segundo, porque o seu realizador Barry Jenkins (esta é apenas a sua segunda longa metragem), também afro-americano mas não gay, teve uma infância muito idêntica à da personagem central “Chiron”. Em entrevista à revista E, do Expresso, Jenkins confessou que também era pobre, tinha uma mãe perturbada e o primeiro amigo branco que teve foi aos 18 anos, quando já andava na universidade.
Mais do que qualquer elemento – fotografia, montagem, banda sonora (que não é nada má) – é a narrativa que faz com que este filme mereça ser visto. Dividido em três partes (com os títulos “Little”, “Chiron” e “Black”, que representam a fase da infância, a da adolescência e a da adultez de “Chiron”, interpretadas por Alex R. Hibbert,  Ashton Sanders e Trevante Rhodes, respetivamente), Moonlight assume-se como espelho da vida de um jovem que, desde pequeno, teve que aprender a lidar sozinho com uma mãe viciada em drogas (Naomie Harris aparece estrondosa como “Paula”), um pai ausente (especula-se que “Chiron” tenha sido fruto de um caso de uma noite só) e um bullying constante por parte dos seus colegas de escola. A compreensão e o companheirismo chegam apenas de três personagens que, não sendo família, revelam-se cruciais no seu processo de maturação: “Juan” (Mahershala Ali) e a sua esposa “Teresa” (Janelle Monáe) acabam por ser os pais que faltavam, e “Kevin” (Jaden Piner, Jharrel Jerome e André Holland) o único amigo e amor da vida de “Chiron”, aquele que o desperta para a sexualidade.
Moonlight tem sido muito aclamado por espelhar na tela a história de um negro gay, mas não é a primeira vez que isso acontece no cinema – basta recordarmos, por exemplo, Pariah, de 2011, realizado por Dee Res, sobre “Alike”, uma adolescente de cor que, à medida que vai crescendo, não sabe se deve expressar a sua verdadeira tendência sexual. Esta história não é, portanto, inédita, ao contrário do que se tem lido por aí. Além disso, também não é a primeira vez que um cineasta decide mostrar a evolução de alguém, nos seus diversos estágios (recordemos o oscarizado Boyhood que trouxe para o grande ecrã, em 2014, a evolução de uma família ao longo dos anos).
Posto isto, não podemos alegar que é a originalidade que faz de Moonlight o principal candidato ao Óscar de Melhor Filme, este ano. O que merece ser, realmente, apreciado nesta adaptação cinematográfica é a entrega e desempenho do seu elenco, bem como o realismo que subjaz a cada cena. Trata-se, de facto, de uma história bem contada, de tal forma que conseguimos sentir algumas vezes que, ao luar, os rapazes negros parecem mesmo azuis.
Moonlight, com o seu quê de positivo e de negativo, marca, sem dúvida, 2017. Aliás, Jenkins não podia ter trazido o filme em melhor altura. Afinal, como tem sido falado, parece haver uma vontade desmesurada, por parte da Academia, de pedir perdão pelos "Oscars so White" do ano passado. O que me entristece quando falo deste filme é a imagem que me surge, de forma imediata e sem a devida autorização, na mente: vejo Hollywood a mirar Moonlight e a exclamar "um filme só de negros? Veio mesmo a calhar!".
Termino com a esperança de que haja bom senso e rigor na entrega dos Óscares 2017. É disso que o mundo precisa. No cinema e fora dele.

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