quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

"Bohemian Rhapsody" (2018). Deturpar para entreter.


Pontuação: 6.5/10 


M/12 | 2h14 min. | Biografia, Drama, Música


Título original: Bohemian Rhapsody
Realizador: Bryan Singer, 
Dexter Fletcher
Escrito por: Anthony McCarten, Peter Morgan, Anthony McCarten
Estrelado por: Ramy Malek, Lucy Boynton, Gwilym Lee


"Being human is a condition which requires an anesthetic"
Freddie Mercury.

Quando vi Bohemian Rhapsody no cinema não conhecia, na altura, quase nada das vidas dos elementos dos intemporais Queen. Fui na ignorância, esperando, com isso, aprender  algo sobre a famosa banda (sim, o cinema também pode ser, a meu ver, um meio não meramente lúdico, mas instrutivo), em particular sobre o seu vocalista Freddy Mercury. A verdade é que fiquei encantada com a película. Encantada desde a primeira cena à cena final (ainda que tenha achado algo exagerado passar na íntegra a atuação dos britânicos no Live Aid – um concerto de solidariedade para com o problema da fome em África ocorrido em 1985). Entretanto, quis escrever uma crítica sobre o filme em questão e comecei a pesquisar mais sobre os Queen e sobre a obra cinematográfica em si. Hoje, sinto-me desiludida e até um pouco atraiçoada. Afinal, este trabalho pouco ou nada me ensinou. 


Comecemos pela relação entre Freddy Mercury (brilhantemente interpretado por Ramy Malek, em cima) e “Mary Austin” (intepretada por Lucy Boynton, em cima). Bohemian Rhapsody faz-nos acreditar que esta rapariga de ar celestial foi o grande amor da vida do cantor (e, de facto, ela foi crucial na vida dele, tanto que até teve direito à belíssima música “Love of My Life”). No entanto, pelo meio do noivado com “Mary”, “Freddy” teve casos com outras mulheres que são caídas no esquecimento. Também a relação entre o vocalista e “Jim Hutton” (Aaron McCusker) é completamente secundarizada – este homem só aparece nos minutos finais do filme e não lhe é dada, de todo, a devida importância (note-se que foi com ele que “Freddy” viveu até ao fim da sua vida). 
Outras omissões importantes: “Freddy” aparece como sendo o primeiro a tentar lançar-se numa carreira a solo e é visto pelo restante grupo musical como um traidor, mas, na verdade, o baterista “Roger Taylor” (Ben Hardy) - o real supervisionou mesmo a banda sonora deste filme, juntamente com o guitarrista Brian May - já tinha lançado dois discos sozinho. E disso... ninguém fala. 


Finalmente, por forma, talvez, a levar ao clímax o envolvimento emocional do espectador, o filme sugere que “Freddy” havia sido diagnosticado com HIV antes do concerto do Live Aid, mas, na realidade, pensa-se que a mesma doença só terá sido descoberta em 1987, ou seja, dois anos depois do referido espetáculo. É normal (e isso é algo que todos compreendemos, porque o cinema também é uma arte que quer emocionar, exaltar, arreliar...) que os cineastas modifiquem um ou outro pormenor nas histórias de cariz biográfico. Mas não é normal que as adulterem desta forma (chegamos a um ponto em que já não sabemos, de facto, em que é que podemos acreditar, se é que podemos acreditar em alguma coisa!). Se o filme é biográfico, então tem que seguir as biografias das suas personagens com o mínimo de rigor. 
Incongruências à parte, o que é que se salva nesta obra que começou a ser realizada por Bryan Singer e terminou com o trabalho de Dexter Fletcher (pouco ou nada mencionado)? Algumas coisas importantes: o trabalho de guarda-roupa e de maquilhagem; a edição sonora; as eternas músicas dos Queen que não nos cansamos de ouvir; e a interpretação de Ramy Malek, possível vencedor do Óscar de Melhor Ator, este ano. O seu preciosismo é inacreditável! Já se deram ao trabalho de ver a sua postura e as suas feições durante o concerto supra mencionado ao lado da postura e das feições do verdadeiro Freddy? É de arrepiar. É mesmo.

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