sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

"The Greatest Showman" (2017). Sobre a arte de fazer os outros felizes.


Pontuação: 9/10

M/12 | 1h 45min | Biografia, Drama, Musical

Realizado por: Michael Gracey
Escrito por: Jenny Bicks, Bill Condon
Estrelado por: Hugh Jackman, Michelle Williams, Zac Efron


"The noblest art is that making others happy."
P. T. Barnum


Após Os Miseráveis (2012), Hugh Jackman (cf. imagem supra) volta a ser o protagonista de um musical que confessa ser a sua passion piece. Encarnando o papel de um empresário do século XIX, "P. T. Barnum", um homem que virou o mundo do espetáculo de pernas para o ar, o ator volta a estar na corrida aos Globos de Ouro na categoria de "Melhor Ator". The Greatest Showman está ainda nomeado para "Melhor Filme - Comédia ou Musical" e "Melhor Canção Original" ("This is Me", de Benj Pasek e Justin Paul, a dupla que ganhou um Óscar em 2017 por "City of Stars", de La La Land).
Michael Gracey, que antes fazia anúncios e efeitos visuais, estreia-se agora na realização com este filme que torna esta época natalícia um bocadinho mais quente. Não estamos perante algo majestoso, mas estamos perante uma obra bonita, que tem elementos mais que suficientes para nos fazer ir ao cinema. The Greatest Showman merece ser visto num ecrã gigante, desde logo pela sua fantástica fotografia; em casa, nunca terá o mesmo sabor, nem tão pouco o confronto entre o espectador e as personagens estranhas que "Barnum" escolhe para vedetas (e que acabam por se tornar família) terá o mesmo impacto (ver imagem infra).  



Este filme de Gracey é uma devoção ao cumprimento das promessas que fazemos às pessoas que amamos. A personagem interpretada por Jackman (mal grado ser perito em vender fraudes, na vida real; pelo menos, é o que dizem dele) faz com que até o ser humano mais cético acredite que, com vontade e perseverança, seja possível melhorar o mundo. É verdade que "Barnum" demorou 25 anos a dar a "Charity" (Michelle Williams) e às suas filhas (ver imagem infra) a vida que lhes prometeu, mas... Como diz o ditado, mais vale tarde que nunca.


A par de "Barnum", surgem, neste filme, outros amantes de arte (ou de dinheiro; ou de ambas as coisas): "Phillip Carlyle" (Zac Efron) (uma personagem que acaba por quebrar as barreiras do preconceito ao assumir a sua paixão por "Anne", a trapezista do circo que é interpretada por Zendaya) e "Jenny Lind" (Rebecca Ferguson) (ver imagens infra). Personagens a mais? Nem por isso. Cada uma delas merece, à sua maneira, um lugar nesta história. E todas elas têm um desempenho competente, ainda que os playbacks deixem algo a desejar.



Ao contrário do que têm dito alguns críticos de cinema, o brilho artificial que nos chega desta obra cinematográfica não tem mal algum. Os filmes também servem para nos fazer esquecer a realidade circundante. Por que não podemos ficar simplesmente radiantes com belas imagens, belas músicas, belas danças? Por que não sorrir com uma peça que espelha um ideal de filantropia? Se não gostam de musicais, não vejam The Greatest Showman. Se gostam ou suportam, então, juntem a família e vão ao cinema, porque sonhar um bocadinho nunca fez mal a ninguém. Uma coisa é certa: estando predispostos a, é quase impossível não nos tornarmos mais felizes e alegres após estar frente a frente com esta história.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Globos de Ouro 2018 (Nomeados)

A cerimónia dos Globos de Ouro 2018 está marcada para o próximo dia 7 de janeiro. Aqui fica a lista dos nomeados:

Melhor Filme - Drama
Call Me by Your Name
Dunkirk
The Post
The Shape of Water
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri


Melhor Atriz - Drama
Jessica Chastain, Molly’s Game
Sally Hawkins, The Shape of Water
Frances McDormand, Three Billboards Outside Ebbing, Missouri
Meryl Streep, The Post
Michelle Williams, All the Money in the World

Melhor Ator - Drama
Timothée Chalamet, Call Me by Your Name
Daniel Day-Lewis, Phantom Thread
Tom Hanks, The Post
Gary Oldman, Darkest Hour
Denzel Washington, Roman J. Israel, Esq.

Melhor Filme - Comédia ou Musical
The Disaster Artist
Get Out
The Greatest Showman
I, Tonya
Lady Bird


Melhor Atriz - Comédia ou Musical
Judi Dench, Victoria & Abdul
Helen Mirren, The Leisure Seeker
Margot Robbie, I, Tonya
Saoirse Ronan, Lady Bird
Emma Stone, Battle of the Sexes

Melhor Ator - Comédia ou Musical
Steve Carell, Battle of the Sexes
Ansel Elgort, Baby Driver
James Franco, The Disaster Artist
Hugh Jackman, The Greatest Showman
Daniel Kaluuya, Get Out

Melhor Filme de Animação
The Boss Baby
The Breadwinner
Coco
Ferdinand
Loving Vincent

Melhor Filme Estrangeiro
A Fantastic Woman
First They Killed My Father
In the Fade
Loveless
The Square


Melhor Atriz Secundária
Mary J. Blige, Mudbound
Hong Chau, Downsizing
Allison Janney, I, Tonya
Laurie Metcalf, Lady Bird
Octavia Spencer, The Shape of Water

Melhor Ator Secundário
Willem Dafoe, The Florida Project
Armie Hammer, Call Me by Your Name
Richard Jenkins, The Shape of Water
Christopher Plummer, All the Money in the World
Sam Rockwell, Three Billboards Outside Ebbing, Missouri
Melhor Realizador
Guillermo del Toro, The Shape of Water
Martin McDonagh, Three Billboards Outside Ebbing, Missouri
Christopher Nolan, Dunkirk
Ridley Scott, All The Money in the World
Steven Spielberg, The Post

Melhor Argumento
Guillermo Del Toro, Vanessa Taylor, The Shape of Water
Greta Gerwig, Lady Bird
Liz Hannah, Josh Singer, The Post
Martin McDonagh, Three Billboards Outside Ebbing, Missouri
Aaron Sorkin, Molly’s Game

Melhor Banda Sonora Original
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri
The Shape of Water
Phantom Thread
The Post
Dunkirk


Melhor Canção Original
“Home,” Ferdinand
“Mighty River,” Mudbound
“Remember Me,” Coco
“The Star,” The Star
“This Is Me,” The Greatest Showman

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Um filme nas palavras de Danto


"Pois um filme consegue algo de espetacular, não apenas mostrando o que ele mostra, mas mostrando o facto de que ele é mostrado, dando-nos não apenas um objeto, mas uma perceção desse objeto, ao mesmo tempo um mundo e um modo de ver esse mundo."

Arthur Danto, em "Moving Pictures", Quarterly Review of Film Studies 4, n.º1, pp.1-21.

Agora nos Cinemas: novembro de 2017

What Happened to Monday? (pt: Sete Irmãs)


Pontuação: 6.5/10

M/16 | 123 min. | Drama, Ação, Aventura

Realizado por: Tommy Wirkola
Escrito por: Max Botkin, Kerry Williamson
Estrelado por: Noomi Rapace, Glenn Close, Willem Dafoe



"Num futuro não muito distante, o aumento populacional fez com que os recursos naturais do planeta Terra se tornassem insuficientes. Para contornar o problema da escassez, foram criados alimentos geneticamente modificados. Mas as decisão revelou-se desastrosa: a consequência foi uma anormal gestação de gémeos, que agravou o problema de sobrepopulação. Por causa disso, o Governo, em parceria com o Comité do Controlo da Natalidade, criou o que chamaram de nova política do filho único. Quando Karen Settman morre numa sala de partos ao dar à luz as suas sete filhas, Terrence, o pai dela, decide que vai contrariar as políticas governamentais e salvar as suas netas. De modo a passarem despercebidas, ele dá a cada uma o nome de um dia da semana e cria uma regra rígida que todas têm de seguir: apenas podem sair à rua no dia da semana correspondente ao seu nome, assumindo sempre a identidade de Karen Settman, a sua falecida mãe. Tudo corre sem imprevistos durante quase três décadas. Até que, num domingo como tantos outros, uma delas sai de casa e nunca mais regressa…" (retirado de: http://cinecartaz.publico.pt/Filme/377967_sete-irmas; acedido a 13/11/2017).

sábado, 11 de novembro de 2017

"Mel" (2013). Sobre o ir embora.


Pontuação: 8/10

M/16 | 1h36 min. | Drama
Título original: Miele
Realizado por: Valeria Golino
Escrito por: Valeria Golino, Francesca Marciano e Valia Santella; baseado na obra de Mauro Covacich
Estrelado por: Jasmine Trinca, Carlo Cecchi, Libero De Rienzo

Um dia a gente chega e no outro vai embora
/ Cada um de nós compõe a sua história
/ E cada ser em si carrega o dom de ser capaz
/ E ser feliz...
Maria Bethânia

Miele é uma longa-metragem italiana, datada de 2013, que marcou a estreia de Valeria Golino na realização cinematográfica. Baseada no romance A nome tuo, de Mauro Covacich, esta obra conta a história de “Irene” (brilhantemente interpretada pela atriz Jasmine Trinca), uma jovem que vive sozinha, à beira-mar, perto de Roma, num local que, nas suas palavras, consegue ser “o mais belo” e  também “o mais feio”.
Tendo como fundo uma banda sonora que é, ora clássica, ora moderna, Miele toma a música como um elemento essencial, um elemento que grita, sobretudo, nos momentos de clímax. “Irene” não larga, ela própria, os seus headphones. São eles que acompanham a personagem principal nas suas idas ao México (ver imagem infra), viagens que têm como principal intuito arranjar medicamentos veterinários para vender a doentes terminais que querem antecipar a sua morte. É este, de resto, o tema central do filme: a morte assistida. Como explicou a Professora Laura Ferreira dos Santos no seu último livro A morte assistida e outras questões de fim-de-vida, “trata-se da antecipação voluntária da morte em casos clínicos extremamente graves, irreversíveis, e no respeito de todas as salvaguardas existentes nas leis despenalizadoras. Pode revestir-se de duas formas – a auto e a hetero-administrada -, habitualmente designadas de ‘suicídio (medicamente) assistido’ e ‘eutanásia’” (Santos, 2015: 27). Na peça cinematográfica de Golino, o que temos são casos de suícidio medicamente assistido. Quer isto dizer que, apesar de preparar os medicamentos (com água ou vodka), não é “Irene” (aliás, “Mel”, o seu ‘nome comercial’, o único que os clientes conhecem) que os dá a beber: são os próprios doentes que ingerem o produto, sendo as suas mãos as últimas a tocar no copo.


Esta longa-metragem revela-se de extrema pertinência para quem se preocupa em estudar questões éticas levantadas pelo cinema: isto, porque ajuda a complexificar a questão da morte assistida clandestina. Será ela correta, em termos morais? E qual é, afinal, a principal diferença entre a morte assistida clandestina e a morte assistida legal? Além destas questões, o filme obriga-nos a pensar nos limites do suicídio medicamente assistido ou até mesmo da eutanásia: quando é que alguém pode decidir morrer? A pergunta surge no íntimo de “Irene” quando esta se depara com um engenheiro, o "Sr. Grimaldi" (Carlo Cecchi) (ver imagem infra), que lhe compra o barbitúrico para pôr fim à sua vida, mas que, nas palavras do próprio, “tem uma saúde de ferro” (apesar da quantidade exorbitante de cigarros que fuma). O homem não tem qualquer doença física, mas perdeu o interesse em viver. Ora, será que o sofrimento de ordem psicológico pode constituir uma base aceitável para conceder a morte assistida?


Quebrando a enorme barreira que estabeleceu entre si e os seus clientes, “Irene” acaba por dizer o seu nome verdadeiro ao engenheiro e cria, com ele, uma enorme relação de cumplicidade. Notamos, ao longo do drama, minuto após minuto, que os laços que se criam entre as duas personagens devem-se ao facto de ambos estarem sós no mundo. É certo que a protagonista tem pai e tem um amante, mas o trabalho que escolheu não lhe permite ser sincera com nenhum dos dois. Desabafar é, para ela, não raras vezes, impossível. O seu rosto denota essa mesma impossibilidade, com expressões que deixam qualquer espectador sensível absolutamente atordoado. 
Miele é a realidade e a densidade humanas espelhadas no grande ecrã. Vencedor de uma menção especial do júri ecuménico no Festival de Cannes e finalista do Prémio Lux, este filme é, nada mais, nada menos, que uma estreia em grande da realizadora Golino.


Referência bibliográfica: Santos, Laura Ferreira (2015). A Morte Assistida e Outras Questões de Fim-de-Vida. Coimbra: Almedina.

terça-feira, 7 de novembro de 2017

"Sabotage", de Alfred Hitchcock (1936)

Pontuação: 7,5/10


Título original: Sabotage (À 1 e 45, em português)

Duração: 1h16 min.

Género: Thriller

Realizado por: Alfred Hitchcock

Baseado em: The Secret Agent, de Joseph Conrad

Estrelado por: Sylvia Sidney, Oskar Homolka, Desmond Tester e John Loder




Porque nunca é de mais revisitar o cinema do mestre de suspense, sugerimos o visionamento de Sabotage, um thriller que enceta, precisamente, com a definição de "sabotagem". Ao longo de 1 hora e 16 minutos, assistimos à vida paralela do dono de um cinema, "Mr. Verloc" (Oskar Homolka), em Londres, um homem que, aos olhos da sua esposa (Sylvia Sidney), é uma pessoa extremamente bondosa e pacata. O problema é que ele acaba por arrastar o irmão de "Mrs. Verloc", o pequeno "Steve" (Desmond Tester), para as suas artimanhas e o pior acontece... O vídeo que se segue mostra a cena central desta história de Hitchcock, uma cena que chocou e revoltou muitos fãs:


sexta-feira, 27 de outubro de 2017

"Porto" (2016). Deslumbre Fotográfico.


Pontuação: 8/10

M/16 | 1h16 min. | Drama, Romance

Realizado por: Gabe Kingler
Escrito por: Larry Gross, Gabe Klinger
Estrelado por: Anton Yelchin, Lucie Lucas, Paulo Calatré


"É como se não tivéssemos escolha..."
- "Jake"


Porto, do realizador Gabe Klinger, é a prova de a beleza mora, não raras vezes, na simplicidade. Não estamos perante um filme perfeito, longe disso; mas estamos perante uma obra que tem muitos aspetos positivos a ressalvar. Comecemos pela frugalidade que pinta a narrativa: na cidade invicta, conhecemos um homem chamado “Jake” (interpretado, de forma brilhante, pelo já falecido ator Anton Yelchin), que vai fazendo uns biscates para sobreviver, e uma mulher francesa, um pouco mais velha, de seu nome “Mati”, que estuda arqueologia. Num único dia, os dois cruzam-se três vezes, duas sem querer, a última talvez de propósito. Os olhares que trocam no café “Ceuta” conduzem as personagens a uma noite de amor sem pressas, sem horas.


O argumento, dividido em três capítulos (“Jake”, “Mati” e “Jake & Mati”) é este: um homem, uma mulher e um serão de sexo e de frases soltas (belíssimas e profundas) que se quedam no instante em que são proferidas. Como é que se conta algo tão simples num filme de uma hora e um quarto? Com cuidado. Muito cuidado. Klinger dividiu o drama em três tempos, alternando imagens capturadas em suportes distintos – 16 mm, 35 mm e Super 8; é certo que o trabalho de edição não é o melhor que já se viu no cinema, pois o filme contém alguns cortes bruscos; além disso, a passagem de imagens completamente nítidas para imagens desfocadas causa, por vezes, um certo desconforto no espectador; no entando, há aspetos cinematográficos que nos aquecem o coração, nomeadamente a fotografia de Wyatt Garfield que nos faz abraçar um Porto cheio de luzes reconfortantes e de lugares familiares. Depois, as referências ao cinema de Jim Jarmusch, o realizador de Paterson (2016), que é, aliás, o produtor executivo deste drama. Finalmente, são-nos ofertados planos exímios, como aquele em que vemos “Mati”, com um guarda-chuva vermelho aberto, a olhar, nostálgica, para dentro do café supra mencionado (ver imagem infra).



Cada vez mais, creio que são os pequenos pormenores extremamente bem filmados e os pequenos acontecimentos sublimemente contados que nos deixam com vontade de rever um filme. E Porto é para rever, sem quaisquer sacrifícios.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

"The Snowman" (2017). Frio como a neve.


Pontuação: 4/10


M/16 | 1h59 min. | Crime, Drama, Terror


Realizado por: Tomas Alfredson
Escrito por: Peter Straughan, Hossein Amini, Soren Sveistrup; baseado no livro de Jo Nesbø
Estrelado por: Michael Fassbender, Rebecca Ferguson, Charlotte Gainsbourg


"I think it's the falling snow that sets the killer off" - "Katrine Bratt"


Parece que o cinema americano continua a insistir na adaptação frouxa e despreocupada de obras literárias nórdicas para o cinema. Depois dos péssimos remakes que foram Let Me In (2010) e The Girl with the Dragon Tattoo (2011), surge The Snowman (2017) que, apesar de não ter outra adaptação à qual se comparar, não deixa de ser um desastre. Tomas Alfredson, o realizador de Tinker, Tailor, Soldier, Spy (A Toupeira, em português), tentou recriar, no grande ecrã, o terror e a forte atmosfera emocional do livro de 2007 de Jo Nesbø, mas o resultado final fica muito aquém das expectativas.


The Snowman gira em torno do trabalho de investigação do detetive "Harry Hole" (representado por Michael Fassbender) e da novata "Katrine Bratt" (ver imagem supra). A ação decorre em Oslo, uma cidade que se vê refém de uma série de assassinatos "assinados" por um boneco de neve (ver imagem infra). As vítimas são sempre do sexo feminino e mães e o serial killer só atua quando neva. Eis informações que poderiam despoletar bons momentos de suspense. Se eles existem, de facto, neste filme que prometia isso mesmo com o seu trailer? Nem por isso.


Desenganem-se se pensam que conseguem estabelecer qualquer tipo de relação empática com alguma das mulheres assassinadas. O filme está tão mal construído e tem tantas lacunas que nós, espectadores, não nos conseguimos afeiçoar às personagens (nem ao próprio protagonista, cuja vida é apenas rabiscada;  veja-se, desde logo, a cena inicial, aquela em que "Harry" acorda de manhã, numa cabana, no meio de um parque, com uma garrafa na mão; o que é que aconteceu para ele estar ali e daquela forma? Não sabemos. A obra termina sem que seja facultada uma resposta a esta pergunta). Dói admiti-lo, mas a verdade é que, em The Snowman, nem a brilhante e belíssima musa de Lars von Trier, a atriz Charlotte Gainsbourg, é suficiente para aquecer os nossos corações (ver imagem infra).
O que é que temos, então, com esta longa metragem de Alfredson? Bonitas paisagens da Noruega. De resto, não há muito que possamos aproveitar: nem em termos de argumento, que é demasiado confuso e incompleto, nem em termos de técnica, que é de uma prematuridade injustificada. 

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

"Paterson" (2016). Pura Poesia, Poesia Pura.


Pontuação: 9/10

M/12 | 1h58m. | Comédia, Drama, Romance

Realizado por: Jim Jarmusch
Escrito por: Jim Jarmusch, William Carlos Williams (poem), Ron Padgett (poems)
Estrelado por: Adam Driver, Golshifteh Farahani, Nellie


Paterson: I guess you really like poetry then?
Japonese Poet: I breathe poetry.
Paterson: So you write poetry?
Japonese Poet: Yes. (...) My poetry only in Japonese. No translation.
Poetry in translations is like taking a shower with a raincoat on.


Nos EUA, no estado de New Jersey, há uma cidadezinha chamada Paterson. Foi nela que nasceu um pediatra e poeta chamado William Carlos Williams, aquele que escreveu aquele longo poema de seu nome “Paterson” (dizem que foi inspirado em Ulisses, de James Joyce, e que surgiu também como uma resposta a The Waste Land, de T. S. Eliot). E foi esta mesma obra que levou Jim Jarmusch a realizar este filme que tem como personagem principal um homem chamado... Adivinhem?! “Paterson”.
A história de Paterson começa numa segunda feira, termina na segunda feira seguinte e o que vemos nos “entretantos” é a rotina da vida de um casal que encarna uma América tranquila, pacata, desligada de maquinarias e de tecnologias. Uma América que ainda sabe sentar-se à mesa e conversar. Uma América que não tem medo de falar com estranhos. Uma América que mais parece, enfim, uma utopia.
“Paterson” (interpretado por Adam Driver; ver a primeira imagem infra) é um motorista de autocarros na cidade de Paterson e a sua esposa, “Laura” (interpretada por Golshifteh Farahani), é uma dona de casa que passa o tempo a pintar cortinas, a fazer cupcakes, a tocar guitarra e a cozinhar tartes com couves de bruxelas e queijo. No meio de tudo isto, temos, da sua parte, uma veneração ao preto e ao branco, provavelmente ao yin e ao yang, porque se há coisa que este filme é é zen (ver a segunda imagem infra).

 


Urge perguntar: como é que uma longa metragem com um argumento tão linear, tão simples, nos consegue apaixonar? Como é que não nos cansamos de ver “Paterson” acordar sempre à mesma hora (com o seu “despertador biológico”; sim, porque a personagem recusa-se a ter um smartphone...), ir trabalhar, escrever uns versos no seu pequeno caderno antes de ligar o autocarro, voltar para casa, endireitar a caixa do correio, jantar com “Laura”, passear “Marvin” (um buldogue inglês giríssimo, que mais parece falar a linguagem humana), parar no bar de sempre, beber uma cerveja, regressar a casa e dormir? Porque, por detrás de toda esta mesmice, há Poesia: a que “Paterson” escreve (o autor dos poemas declamados no filme – e escritos propositadamente para esta obra – é Ron Padgett, amigo de Jarmusch), a que “Paterson” lê (de Williams), a que se esconde por detrás da queda de água onde o protagonista pára, não raras vezes, para refletir e ainda a que mora na casa do casal - nos seus quadros, nas suas paredes e nos vestidos de "Laura".


Paterson é de uma simplicidade e de uma beleza difíceis de encontrar no cinema de hoje em dia. Sabemo-lo, desde logo, por causa daquele extraordinário diálogo entre “Paterson” e o “Poeta Japonês”, um diálogo que emerge quase no final do filme e que é, a meu ver, nada mais, nada menos, que uma espécie de sublime kantiano (leiam a epígrafe deste artigo e deliciem-se). Este filme até poderia ser (e desculpem-me a expressão!) uma "valente seca"; mas, ainda assim, merecia ser visto só por causa desta mesma conversa, uma conversa entre dois homens que respiram palavras escritas. Que as amam. E amam sem pressas.



Estamos perante uma obra que é, no seu todo, Pura Poesia e, ao mesmo tempo, Poesia Pura: Poesia prosaica, quotidiana, terrena. A mais bonita e sincera, portanto.

sábado, 23 de setembro de 2017

"Mother!" (2017). Das Calmarias Apocalípticas.


Pontuação: 9/10
M/16 | 2h01m. | Drama, Terror, Mistério

Realizado por: Darren Aronofsky
Escrito por: Darren Aronofsky
Estrelado por: Jennifer Lawrence, Javier Bardem, Ed Harris, Michelle Pfeiffer



"I wanna make a Paradise."
- "Mother"

Mother! é um filme audacioso, mas que não agrada a qualquer um. Penso que estamos perante uma daquelas obras cinematográficas sem meio-termo: ora amamo-la, ora odiamo-la e, em qualquer dos casos, com a maior das nossas forças. Este novo filme de Aronofsky, realizador do aclamado Black Swan (2010), graças à sua grandiosidade e barbaridade, salta fora da corriqueirice da Paramount Pictures e obriga-nos a aceitar a ideia de que nem todo o cinema americano é lixo. 
A história que chegou, na passada quinta-feira, ao grande ecrã, parece bastante simples: é sobre uma mulher que, aos poucos, dia após dia, reconstrói a casa do seu marido, deteriorada por um incêndio. Além da sua enorme habilidade para trabalhos manuais, ela, a mother (Jennifer Lawrence) (ver a primeira imagem, infra), é uma dona de casa exemplar e uma esposa devota. Já o marido (Javier Bardem) é um escritor mundialmente conhecido que atravessa uma enorme crise, uma crise que faz com que da sua caneta não saia qualquer tinta ou do seu pénis qualquer esperma.


Apesar do bloqueio da personagem de Bardem, os primeiros minutos de filme conseguem transmitir-nos alguma paz. Veja-se uma das cenas iniciais, aquela em que a porta da mansão se abre, naquela manhã solarenga em que Lawrence se levanta de uma forma algo desconcertante e, de uma maneira tão ímpar, olha para aquele campo verde, tão imenso e maravilhoso... Nós, espectadores, respiramos aquele mesmo ar puro (e tudo graças ao exuberante trabalho de realização!). Arriscaria dizer que ficamos com vontade de morar ali, naquele mesmo lugar. Mas o silêncio é fugaz (se é que há algum silêncio nesta obra!) e a tranquilidade que reinava na mansão do casal culmina aquando da chegada de um médico (Ed Harris) que, com pouco tempo de vida, quer conhecer o seu ídolo, o Poeta. Atrás dele vem a sua esposa (Michelle Pfeiffer) (ver imagem infra). E depois os filhos deles. E depois, mais gente... Tanta gente... 


Em Mother!, a calmaria é tão efémera que, quando damos por nós, num ápice, num abrir e piscar de olhos, já estamos no centro de um Apocalipse: os visitantes do casal protagonista são intrusivos, a câmara de Aronofsky é intrusiva, tudo é intrusivo. A cada minuto de filme, sentimos o nosso batimento cardíaco a acelerar mais e mais, a nossa respiração torna-se ofegante e não conseguimos retirar o olhar da tela, por muito que o nosso cérebro nos diga "chega!", "basta!". A arrumação dá lugar ao caos. A degradação parece não ter fim. Os gritos de Lawrence são dela. São nossos. São de todos aqueles que acreditam, como o filósofo Nietzsche acreditava, que devemos martelar todos os ídolos e toda aquela moral de rebanho com um martelo, porque ir com a multidão é o mesmo que viver uma mentira. É deixarmo-nos sugar. Ainda assim, não se pense que, com isto, quero dizer que este filme tem como objetivo transmitir esta mensagem ou qualquer outra em particular: em boa verdade, creio que o grande intuito de Aronofsky era deixar o espectador atordoado, confuso, impotente, e isto tomando como muleta uma operação de câmara absolutamente divina.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

"Una" (2016). Seduções improváveis.



Pontuação: 7/10

M/16 | 1h34m. | Drama

Realizado por:
Benedict Andrews
Escrito por:
David Harrower (baseado na sua peça "Blackbird")
Estrelado por: Ruby Stokes, Rooney Mara, Ben Mendelsohn


"I don't know anything about you except you abused me"
- "Una" (Rooney Mara)

Podemos entender Una como um filme que conta não uma, mas duas histórias, ao mesmo tempo: a primeira, sobre um amor entre um adulto e uma criança de 13 anos; a segunda, sobre um caso de pedofilia que obriga o homem envolvido a mudar a sua identidade e a rapariga abusada a sobreviver com relações sexuais vazias. Cabe ao espectador escolher qual das duas vence, no final.
Esta longa-metragem é baseada numa peça de teatro, Blackbird, de David Harrower, o que explica que o seu argumento seja contado, por parte do realizador Benedict Andrews (estamos perante a sua estreia no cinema), sem grandes pressas. Em Una, é tudo lento e pesado. Os próprios protagonistas Ben Mendelsohn (“Ray”) e Rooney Mara (“Una” que, em jovem, é brilhantemente representada por Ruby Stokes - ver fotografia infra) vestem a pele de personagens sofridas, nostálgicas e incompreendidas. Personagens a quem o tempo não cura as feridas, pelo contrário: nesta obra, a passagem do tempo só traz mais dor, de tal forma que a personagem principal, com 27 anos, ainda nem conseguiu abandonar a casa da mãe, largar o ninho, construir uma vida autónoma.


Por forma a tentar compreender o que sucedeu no passado, “Una” procura “Ray” (cujo novo nome é “Pete”) na fábrica onde este trabalha para exigir explicações sobre o que aconteceu há vinte e tal anos atrás, quando os dois se envolveram. A conversa entre os protagonistas é intercalada com uns quantos flashbacks que, pela forma como são construídos, acabam por nos desvincular do lado mais teatral da história. É então que, à medida que os minutos passam, damos por nós a pensar numa série de questões eticamente relevantes, entre as quais: poderá uma relação amorosa entre um adulto e uma criança ser moralmente aceitável?
Não descurando algumas falhas de realização, normais em quem só enveredou agora pelo mundo da sétima arte (veem-se alguns cortes bruscos – logo no início, temos um que nos faz abandonar uma menina, que caminha silenciosamente, para abraçar uma discoteca, discoteca essa onde as luzes neon e a música eletrónica ofuscam e ensurdecem), a verdade é que este filme está cheio de grandiosos close-ups e de outros tantos planos bem construídos (no momento em que se encontra à porta da já referida fábrica, vemos o reflexo de uma “Una” pálida e triste pelo espelho retrovisor do seu carro, um reflexo que mora dentro de um enquadramento quase perfeito). Além disso, como sabemos, não é fácil transpor a linguagem e os gestos tipicamente teatrais para o cinema (relembre-se Fences, de 2016, que falhou, e redondamente, a meu ver, o objetivo). Posto isto, Andrews foi minimamente competente e Una acaba por ser um filme que merece ser visto.

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

"Dunkirk" (2017). Da terra, do ar e do mar.


Pontuação: 6/10

M/12 | 1h46 m. | Ação, Drama, História

Países: UK, Holanda, França, EUA
Realizador: Christopher Nolan
Escrito por: Christopher Nolan
Estrelado por: Fionn Whitehead, Damien Bonnard, Aneurin Barnard


Captain Winnant: What do you see?
Commander Bolton: Home.

Maio de 1940. Segunda Guerra Mundial. Os soldados Aliados encontravam-se encurralados e submetidos aos bombardeamentos da Luftwaffe, a força aérea alemã, na região de Dunquerque. Lá, esperaram, durante dias, por um resgate. O novo filme de Christopher Nolan traz ao grande ecrã a história dessa mesma evacuação, a Operação Dínamo, também conhecida como "Milagre de Dunquerque". Um milagre que abarcou cerca de 400 mil homens que conviveram de perto com o desespero.
Apesar da grande dose de ficção, Dunkirk também consegue ser, de um ponto de vista histórico, autêntico e fiel. Este é, desde logo, um dos seus aspetos positivos. Logo nos minutos iniciais, vemos soldados cobertos por folhetos que os nazis produziam alertando para uma impossibilidade de fuga. A verdade é que os alemães elaboraram, de facto, esses mesmos folhetos, tanto em francês como em inglês. Para além do grau de veracidade de alguns momentos como o ainda agora enunciado, a nova longa metragem de Nolan arrasa no que à montagem e edição de som diz respeito: é quase impossível encontrar um espectador que não admita que ouviu de muito perto o barulho das ondas do mar ou que sentiu na pele todas aquelas brutais explosões ocorridas. Já no que respeita à fotografia, da responsabilidade de Hoyte van Hoytema (Intersteller, Her,...), também há muitas vénias a fazer: as cores de Dunkirk são de uma beleza estonteante. Cada imagem que nos chega da praia faz-nos colocar os pés na areia e a cabeça no céu. Este é, sem dúvida, um elemento técnico de destaque.
Por outro lado, há qualquer coisa que falha em Dunkirk: estamos perante um filme de guerra, sabemos que os ruídos fazem parte de qualquer batalha... Mas a banda sonora de Hans Zimmer acaba por ser de um exagero sem igual (parece-nos ser mesmo a pior criação do compositor). Passados 20 minutos de filme, já não conseguimos suportar aqueles sons, ora hiper-realistas, ora enfáticos. Em vez de criar tensão, a obra de Nolan acaba por, a dada altura, criar irritação. O realizador quis tornar o diálogo entre personagens num elemento de menor importância, mas acabou por compensar (ou melhor, descompensar) essa falta com uma música que chega a provocar náuseas. Há muitos momentos de Dunkirk que pedem silêncio e esse silêncio acaba por nunca chegar.
Além do problema da banda sonora desmesurada, este filme delineia-se como um espetáculo digital despido de todo e qualquer laivo de humanismo. É certo que nos dá a conhecer aquele pai e aquele filho ingleses que, no seu pequeno barco, tentam resgatar, em alto mar, os seus compatriotas perdidos. Quando surgem no ecrã, há um conforto que aquece o nosso coração. Mas o seu surgimento é tão momentâneo, tão efémero, tão fugaz, que não chega para colmatar a falta de filantropia que sentimos.
Em Dunkirk, temos ritmo, vulcanicidade... Temos a terra, o ar e o mar em grande destaque. E também temos fogo, é certo. Mas a falta de contenção de Nolan torna tudo tão frio e tão meramente frenético que nem o momento do resgate consegue proporcionar-nos conforto.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

"La Mujer sin Cabeza" (2008). Do ser "Verónica".


Pontuação: 7,5/10

M/12 | 1h27 | Drama, Mistério, Thriller

Países: Argentina, França
Realizado por: Lucrecia Martel
Escrito por: Lucrecia Martel
Estrelado por: María Onetto, Claudia Cantero, Inés Efron


La Mujer sin Cabeza, de Lucrecia Martel, enceta numa estrada onde vemos crianças a brincar. Depressa os seus risos inocentes dão lugar à música que toca no rádio do carro de “Verónica” (interpretada pela brilhante e segura María Onetto). Daí até abraçarmos um silêncio profundo e incómodo pouco tempo decorre. Depois da dentista bater em algo, enquanto conduz, nada ouvimos. Talvez apenas um eco da sua respiração acelerada. Nesta mesma cena inicial, acabamos por ficar trancados com a protagonista, dentro do seu carro, e, tal como ela, não sabemos o que fazer. De repente, começa a chover e percebemos que não podemos parar de ver esta obra, pois a forma como a realizadora filma os pingos de água a bater no vidro é, pura e simplesmente, perfeita.
O cinema de Martel é uma espécie de espelho de relações familiares e dos seus tormentos: nesta longa-metragem, temos uma mãe que não se recorda da existência das netas, uma traição e ainda uma jovem que surpreende a família ao levar uma namorada para casa. Não descurando a importância destes pormenores, a verdade é que o foco do argumento e da própria câmara é sempre “Verónica”. É ela que é filmada de perto, de muito perto, e é na cabeça dela que entramos sem nunca entrar, verdadeiramente. Depois do acidente da cena inicial, o mistério instala-se e as lágrimas tornam-se bastante presentes nos olhos da protagonista, que não sabe se atropelou um ser humano ou um animal. O ambiente em que nos quedamos enquanto espectadores é tão intimista que, às tantas, até nos questionamos se, nós próprios, fizemos alguma coisa de mal. Será que, de alguma forma, também somos culpados?
O típico cinema de Hollywood habituou-nos a obter respostas, mas, aqui, Martel nada mais nos deixa a não ser enigmas. A personagem principal é, ela mesma, um enigma. Ainda assim, a forma como os familiares agem com ela é bastante terna e até carnal. Parece, por vezes, que todos, marido, sobrinhos e irmãs, lhe querem arrancar um pedaço de carne por forma a conseguir ler todos os seus silêncios. Talvez por isso "Veronica" chegue até nós em cacos. Talvez por isso sintamos que só a água (não me recordo de um filme onde este elemento tenha tanto poder) a consegue acalmar: a da chuva que cai, a do chuveiro que a limpa dos pecados e a das lágrimas que a conduzem a um estado catártico que é meramente momentâneo.
Este filme é a prova de que o cinema tem, em si, a capacidade de nos fazer colocar no lugar do outro. Em La Mujer sin Cabeza, o essencial é sentir por “Verónica” e, mais do que isso, sentir com “Verónica”.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

"Planeta dos Macacos: A Guerra" (2017). Um verdadeiro espetáculo digital.


Pontuação: 8/10

M/12 | 2h20 min. | Ação, Aventura, Drama

Título original: War for the Planet of the Apes
Realizado por: Matt Reeves
Escrito por: Mark Bomback, Matt Reeves
Estrelado por: Andy Serkis, Woody Harrelson, Karin Konoval, Amiah Miller



"Foi um erro ter-vos trazido. Esta guerra não é vossa..." - "César"

A época sazonal em que nos encontramos costuma ser pouco favorável a todos aqueles apreciadores de cinema que gostam de ver, no grande ecrã, muito mais do que um mero entretém de domingo à tarde. Planeta dos Macacos: A Guerra (2017) estreou hoje nas salas de cinema portuguesas e é uma verdadeira lufada de ar fresco para todos aqueles amantes da sétima arte que estão cansados de ver muita ação e pouca humanidade.
O novo filme de Matt Reeves vem no seguimento de Planeta dos Macacos: A Origem (2011), realizado por Rupert Wyatt, e Planeta dos Macacos: O Confronto (2014), também de Reeves. Com um argumento que não traz grandes novidades – à exceção, talvez, de uma humana primitiva sobre a qual falaremos mais adiante –, esta obra coloca, frente a frente, macacos e homens que pretendem defender a sua espécie mesmo que, para isso, tenham que fazer sacrifícios (como matar os próprios filhos). O confronto entre ambos surge, porque o vírus responsável pelo grande desenvolvimento das capacidades cognitivas dos símios ameaça destruir a raça humana, uma raça que se quer, como reforça o “Coronel” (interpretado por Woody Harrelson), superior. Se, por um lado, os macacos aprendem a falar a nossa linguagem, por outro, ficamos a conhecer homens e mulheres que perdem a fala.


“Nova” (interpretada pela belíssima Amiah Miller) é, talvez, e a par do protagonista “César” (interpretado por Andy Serkis) (ver imagem supra), a personagem que mais emoções despoleta no espectador. Compreendemos que a sétima arte é preciosa quando assistimos a cenas como a do encontro entre esta menina e “Maurice” (Karin Konoval) (ver imagens infra): o esforço que “Nova” faz para comunicar com o símio é arrepiante e a forma ternurenta como este último a olha denota um humanismo por vezes difícil de encontrar entre os membros da nossa espécie. Neste mesmo instante, o que Reeves nos oferece são dois dos mais brilhantes close-ups da história do cinema mais recente.



A par de “Nova”, é introduzida, nesta saga, uma outra nova personagem - “Bad Ape” (interpretado por Steve Zahn) (ver imagem infra): um macaco que, apesar de conseguir falar, aparece quase sempre amedrontado. Ora, é precisamente esta sua característica que nos faz soltar uma ou outra gargalhada num filme onde, ao contrário do que nos indica o título, a ação não é rainha. A guerra não é rainha. Talvez a misericórdia, essa sim, leve a coroa.


Planeta dos Macacos: A Guerra é, e também ao contrário do que se possa pensar, sobre silêncio. Um silêncio ora amargurado, ora vingativo, ora piedoso, ora pacífico. Um silêncio que é suportado e exaltado por uma banda sonora de Michael Giacchino (o compositor da série Lost – Perdidos e do filme de animação Up – Altamente!) bem conseguida e por uma técnica motion capture absolutamente espantosa. Estamos perante uma peça cinematográfica que é, nada mais, nada menos, que uma verdadeira pérola digital.